Edilaine Pereira Coimbra nunca teve relação com a Vale, mas estava no rio Paraopeba quando chegou a lama, como muitos naquele 25 de janeiro de 2019. Só teve tempo de cortar as 25 linhas, juntar os três filhos que criou com o rendimento da pesca da curimba e seguir pela trilha que não teria mais volta.A vida ficou escassa. Hoje a pescadora sobrevive do salário mínimo que recebe da Vale e da venda de guloseimas pelas ruas de barro sequer registradas na Prefeitura de Betim, a 25 km de Brumadinho.“Eu garanto a você, todo mundo queria a vida que tinha. Nós queríamos nosso rio aí limpo. Era muito mais do que estar aí todo mês pegando um salário mínimo, que agora nem um salário mais é. Acha que a gente tá pedindo esmola. E ninguém tá pedindo esmola. Se ela fez, a obrigação dela é pagar.”Um ano após o maior crime socioambiental da história do Brasil matar 259 pessoas e deixar 11 desaparecidos, em Brumadinho, a Vale cortará pela metade o auxílio emergencial de pelo menos 93 mil pessoas que vivem ao longo dos 48 municípios impactados pela lama despejada na bacia do rio Paraopeba.Previsto no Termo de Acordo Preliminar (TAP) firmado em fevereiro de 2019, o pagamento emergencial – com valor limitado a até um salário mínimo – é atualmente parte do sustento de 108 mil pessoas, que vivem na área entre Brumadinho e o município de Pompéu – a 273 km do local do rompimento da barragem.O valor integral do auxílio, que já é considerado insuficiente pelos atingidos, permanece apenas onde a mineradora definiu como “zona quente”, composta pelas comunidades de Córrego do Feijão, Parque da Cachoeira, Alberto Flores, Cantagalo, Pires, e do entorno do Ribeirão Ferro-Carvão, onde vivem entre 10 a 15 mil pessoas.“A gente sabe que sozinhos somos pequenos. Essa noção de ser pequeno a Vale também tinha, porque senão ela não deixaria essa barragem romper no nosso território. Porque ela sabia o tempo todo que essa barragem ia romper, mas por ser Córrego do Feijão, um bairro rural, pequeno, ela deixou que acontecesse. Porque ali é um bando de trabalhador… ‘que direitos que eles vão ter?’, ‘que direitos que eles vão conquistar?’. Exemplo disso são as indenizações. Nessa tragédia de Brumadinho, elas são pequenas. Elas não têm caráter punitivo. Pra Vale, isso não é nada. Porque ela está pagando indenização, mas sai em superávit trimestral”, questiona Jeferson Custódio, presidente da Associação dos Moradores do Córrego do Feijão.Na comunidade não circulam mais pessoas, somente caminhões carregando poeira e medo do que a Vale não conta aos moradores. Das 272 pessoas mortas no rompimento da barragem, 27 eram do Córrego do Feijão. Custódio relata que 49 famílias já deixaram a comunidade por conta do trauma ou por terem suas propriedades compradas pela mineradora.Os efeitos do crime ainda são evidentes nos locais atingidos. Falta água potável, acesso à saúde e a políticas púbicas, a agricultura definha e o turismo deixou de existir na região. Moradores sucumbem ao adoecimento físico e mental enquanto assistem o desmonte das comunidades rurais e ribeirinhas.Com os modos de vida destruídos, não há perspectiva para recomposição da renda.“Uma que a gente não está conseguindo trabalhar, porque está todo mundo à base do remédio. Todo mundo. Eu mesma tomo várias quantidades de remédio. Eu fui comprar ficou por R$ 380. Aí, vamos supor que a Vale pague nós. Vamos supor não, ela vai pagar só meio salário, mas R$ 380 é para os remédios”, argumenta a agricultora Maria Aparecida da Silva Soares, da comunidade do Tejuco, zona rural de Brumadinho, que cultivava hortaliças há 21 anos.Enquanto isso, no mundo dos negócios a Vale não demonstra mais sinais de trauma pela tragédia que provocou há um ano. A empresa atingiu o valor de mercado de R$ 301 bilhões, R$ 5 bi a mais do que registrava quando do rompimento da barragem. A informação foi divulgada pelo jornal Folha de S. Paulo.Antes disso, em dezembro, a mineradora anunciou a distribuição de R$ 7,25 bilhões a acionistas, pelos resultados da empresa em 2019. O valor é maior que o total investido nas reparações socioambientais do crime de Brumadinho. Segundo a empresa, no ano passado foram aplicados R$ 6,55 bilhões em indenizações e obras.
Apesar das propagandas da Vale, que exaltam ações de reparação ao crime nos principais veículos de comunicação do país, a realidade dos atingidos é o desalento.No bairro da agricultora Maria Aparecida da Silva, o Tejuco, há três mineradoras, além da Vale, o que faz com que o tráfego de caminhões seja intenso – e incessante dia e noite – nas ruas da comunidade.Logo após o rompimento da barragem, com o fechamento das estradas no entorno do Córrego do Feijão e do Parque da Cachoeira, o Tejuco passou a ser a principal via de escape para as operações de resgate e para os veículos das obras emergenciais.Desde então, a poeira coloriu as casas, e atormenta a pele e os pulmões dos moradores, que estão fora da zona quente definida pela mineradora.CLIQUE AQUI E LEIA A REPORTAGEM COMPLETA FEITA POR BRASIL DE FATO
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