Fachada da primeira edificação da Santa Casa Monsenhor Guilherme, criada no final da década de 30 do século passado. Foto de autoria atribuída a Harry Schinke.
Me orgulho, me entristeço e me envergonho de ser iguaçuense. E vamos por parte. Foi muito bom nascer neste canto mais do que belo do planeta, de ser filho de um filho de paraguaio, de ter um mãe brasileira, guerreira, filha de uma cabocla, e de ter crescido nesse caldo de cultura de línguas, de povos, de gente diferente, de trolar com o argentinos no marco brasileiro e de fazer o mesmo com os brasileiros – Maradona es mejor que Pelé – do lado argentino.
Isso sem falar dos banhos nas Cataratas, nos rios Paraná e Iguaçu e em todo ou qualquer curso d’água dessa terra quente no verão e de um frio de rachar no inverno. Já escrevi muito disso em crônicas, contos e memórias do jeito de falar do iguaçuense, de andar e se um acolhedor, por natureza, daqueles que escolheram a cidade para morar ou fazer sua vida.
Facsímile da capa do jornal editado pelo Diretório Estudantil da Facisa, uma das faculdades isoladas que seriam incorporadas na Unioeste. A manchete mostra a luta dos estudantes da região por uma universidade federal no início dos anos 80.
A minha tristeza é da pouca importância que se dá à sua história, identidade, cultura, meio ambiente, e aquilo que esse conjunto de coisas – se isso for termo correto daquilo que quero expressar – pode representar na construção de uma cidade mais digna para todos. É aviltante o que se faz com o patrimônio histórico de Foz do Iguaçu, prédios, casas, estradas que simplesmente são derrubados, destruídos como que não significassem nada para quem nasceu e cresceu aqui.
Nos últimos anos, me identifiquei muito com o filme italiano Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore, que me fez lembrar do Cine Star, em especial, e do Cine Iguaçu. Meu primeiro acesso à cultura, antes mesmo de ler, forma os filmes. A minha adolescência passei no Cine Iguaçu e nas matinês da Boate do Salvatti. O Cine Star foi demolido e uma igreja evangélica tomou o lugar do Cine Iguaçu.
O Oeste Paraná Clube, dos vários carnavais, festas e até apurações das eleições, deu lugar a um supermercado. E a igreja, a Presbiteriana, a qual eu passava pela frente, foi demolida para um estacionamento. O mesmo aconteceu com a Agência de Rendas e a cadeia pública – dois prédios públicos derrubados na rua Barão do Rio Branco.
Facsímile da capa do jornal editado pelo Diretório Estudantil da Facisa, uma das faculdades isoladas que seriam incorporadas na Unioeste. A manchete mostra a luta dos estudantes da região por uma universidade federal no início dos anos 80.O que se faz para que uma visão tão rasteira e predadora se sobreponha a história de uma cidade e até seu processo civilizatório? Nada é tão medíocre e pequeno e não pode ser traduzido em conceitos como de felicidade e bem estar social.
A minha vergonha é que eu, também, pouco fiz para que a predação não avançasse tanto. Com poucos amigos tentei articular um projeto chamado “identidade popular” para que se contassem fatos da história da cidade sob a ótica de quem participou dele. Também editei a revista Cabeza, duas edições impressas e outra que não sai no papel, e de um compêndio com relatos dos chamados pioneiros. Por várias vezes, tentamos criar os conselhos de cultura, as leis de tombamento e passados 100 anos, eles continuam no papel ou com pouca efetividade.
Meu lamento soa como lamúria inoportuna contra a força da grana, que no caso de Foz do Iguaçu, só destrói coisas belas e apaga da memória e da nossa retina um pouco mais das nossas vidas.
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