– Uma crônica de Cearánews –
A vontade de viver fazia com que Zezinho, o Zé Passarinho, continuasse com 38 anos havia mais de 30 anos. Os filhos beiravam os 40 anos, e ele continuava com a mesma idade. O seu bar era o ponto de encontro dos emergentes, falantes, boas gentes e contadores de histórias. O ritmo e tom das conversas quem dava era ele. Numa prosa de uma hora, ele falava 50 minutos, numa sequência de 30 perguntas por minuto. Pesquisador nato, sabia tudo. Das informações locais às articulações internacionais. Coisas deste e de outros mundos. As fontes das informações eram os frequentadores do bar. O estabelecimento foi batizado de Bar do Zé do Copo Sujo. Todo mundo sabia o apelido, menos ele. Não tinha hora nem dia para a clientela chegar. Todo momento era propício para apoiar o umbigo no balcão, tomar remédio, curar o fígado, firmar o pulso, dar um jeito na tristeza, afogar as mágoas… Quem descia o Morro do Pinheiro já avistava lá embaixo um cidadão de um metro e meio de altura, cavanhaque branco, olhar curioso e uma cara amarrada. Turrão, escolhia para quem ir dar trela. Seu bar tinha a localização curiosa. Ficava embaixo da ladeira do Alto dos Pinheiros, ao lado do Morro Alto, e não tão distante do Suvaco da Cobra. Durante o dia, ele usava um chinelão tamanho 44, mesmo precisando apenas de um par tamanho 36. Quando não estava circulando pelos 30 metros quadrados, seu Rachid provavelmente estava sentado acompanhando o noticiário pelo rádio. Um ouvido no rádio e outro na rua. O aparelho ficava ligado o dia inteiro, ao ponto de ele repetir todas as informações da manhã e da tarde. Era comum ele fazer os cálculos matemáticos de rendimentos, despesas, entradas e saídas do bar num rascunho enquanto se informava. O papel era aquele que acoplava dez pacotes de cigarro. Aberto, o papel virava uma grande planilha. De trás da orelha tirava uma caneta toda mastigada e lascava as contas no papel. Os cálculos se misturavam, e o branco perdia espaço numa pintura numérica.
Cearánews é jornalista e escreve crônicas e contos em Foz do Iguaçu. Texto reproduzido do site H2Foz. Editado na revista Escrita 45.
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