“O Curva”, brigadista que inspirou o trabalho de releitura da obra de Portinari observa o mural realizado por Mundano em São Paulo. (Fotos: cinélia)
Por Mônica Nunes / Conexão Planeta
Depois de duas semanas de muito trabalho, realizado numa caçamba erguida por um guindaste na companhia de artistas do grafite, enfrentando o mau tempo e o sol forte e ‘dando um tempo’ por causa da chuva, o artivista Mundano conclui sua maior obra: um painel de mil metros de altura, na empena de um edifício no centro de São Paulo, que batizou de Brigadista da Floresta, “substituindo” o Lavrador de Café, de Candido Portinari, pintado há 87 anos, nesta releitura.
A tinta usada no grafite foi produzida com cinzas e carvão que o artivista colheu, durante três semanas, em quatro biomas que têm sido constantemente devastados pelo fogo – Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal – como parte do projeto Cinzas da Floresta.
Para criar as nuances da paleta especial, o artista misturou o pó das cinzas outras tintas, água, e verniz e deu nomes provocadores aos grupos cromáticos, como Amazônia Destruída, Pantanal em Risco, Cerrado Ganância e Mata Atlântica Devastada.
Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), até agosto, ocorreram mais de 11,2 mil focos de incêndio em locais com a presença do bioma, em todo o território nacional.
O brigadista que serviu de ‘modelo’ para a obra de Mundano foi Vinícius Curva de Vento, de 36 anos, natural de São Paulo, que há seis anos “vive na Chapada dos Veadeiros, onde trabalha em contato com a terra e, quando tem fogo criminoso, ele se junta aos voluntários da Brigada São Jorge e da Rede Contra Fogo pra evitar que o Cerrado não vire pó”, conta o artista.
Imagine a emoção de Vinícius, ao voltar à capital paulista, mais especificamente para a região na qual trabalhou próximo à passarela da Rua 25 de março com Avenida Prestes Maia, de onde se tem a melhor vista da obra, e ver o retrato que Mundano fez dele no Cerrado transformado num super grafite.
Vinícius ficou emocionado, feliz, reflexivo e poético. “Ele voltou pra selva de concreto pra sentir a obra, pintá-la e representar todas e todos brigadistas gigantes que se arriscam apagando fogo pra proteger a natureza, ou seja, nós mesmos”, contou o artivista.
“Isso aqui é Amazonia, Aqui tem Mata Atlântica, Ali tem um tanto de Cerrado…. Isso não é tinta, não! Isso aí é vida!”.
“O Curva subiu a 40 metros de altura, colocou a mão no paredão e nos disse o que sentia”, destacou Mundano:
“Essa tinta grita, mano. Essa tinta queima Esse desenho queima. Essa tinta pede.
Escutem, pelo amor de Deus! Escutem pelo que é mais sagrado! Não percamos mais tempo Vamos entender, por favor. É muito sério! Nunca foi tao sério.
Acabou o tempo da brincadeira! Agora tá muito sério! A gente tem que mudar. Se não, não vai ter amanhã”.
“Pintamos juntos, com as cinzas da floresta, o emblema da Rede Nacional de Brigadas Voluntárias no coração do brigadista”, diz Mundano no texto lindo que escreveu para falar da presença do amigo, em seu Instagram, ilustrado por fotos incríveis (como as usadas nesta página) e vídeos.
Nesse texto, o artivista ainda destaca uma super reportagem exibida na TV, que inclui uma declaração emocionada do filho de Portinari a respeito da releitura da obra famosa do pai, de 1934:
“Eu achei extraordinário. Essa questão do meio ambiente tomou um relevo que não tinha tanto assim antes. Esse trabalho do Mundano é essencial, é oportuno, atualíssimo!”.
Ainda conta: “Eu ainda estou digerindo tanta informação e tentando me recuperar fisicamente. Contudo, posso dizer, de coração cheio, que estou realizado e arrepiado de ver as cinzas da floresta revivendo a obra de Portinari, denunciando crimes ambientais, homenageando heróis e heroínas invisíveis, protestando contra o desmonte ambiental e semeando informação pra milhões de pessoas no Brasil e no mundo”.
E finaliza: “Obrigado a cada pessoa envolvida nessa obra complexa, e isso inclui você que me acompanha, porque arte sem o público não é nada”. Ficou demais!
Explicações de Mundano no Instagram:
“O Brigadista da Floresta” além de uma releitura de Portinari é o retrato do Vinicius Curva de Vento , 36 anos .
@viniciuscurvade vento voltou pra selva de concreto pra sentir a obra, pinta-la e representar todas e todos brigadistas gigantes que se arriscam apagando fogo pra proteger a natureza , ou seja, nos mesmos .
O Curva subiu a 40 metros de altura, colocou a mão no paredão e nos disse o que sentia .
Pintamos juntos com as @cinzasdafloresta o emblema da Rede Nacional de @brigadasvoluntarias no coração do brigadista.
Curva de Vento, já trabalhou próximo à passarela da rua 25 de março com Av. Prestes Maia onde é tem a melhor vista da obra, e pra ele voltar ali teve um significado especial .
8 anos atrás foi viver mais próximo da natureza na Chapada dos Veadeiros onde trabalha em contato com a terra e quando tem fogo criminoso estalando ele se junta a @brigadasaojorge e a @redecontraofogo pra evitar que o Cerrado vire pó .
Eu ainda estou digerindo tanta informação e tentando me recuperar fisicamente.
Contudo posso dizer de coração cheio que estou realizado e arrepiado de ver as @cinzasdafloresta revivendo a obra de Portinari, denunciando crimes ambientais, homenageando heróis e heroínas invisíveis, protestando contra esse desmonte ambiental e semeando informação pra milhões de pessoas no Brasil e no mundo.
Obrigado a cada pessoa envolvida nessa obra complexa, e isso inclui você que me acompanha, porque arte sem o público não nada.
#artivismo #releiturasmundanas #brigadistas #cinzas
A cada obra, o artivista Mundano cresce e impacta mais pessoas com seus alertas. É como mostra o site Conexão Planeta – desde janeiro de 2017.
Foi assim com os catadores, com o Pimp My Carroça, com o Cataki ou ‘Tinder da Reciclagem’ – aplicativo premiado! -, com os manifestos pictóricos contra a Vale pela tragédia criminosa em Brumadinho e o derramamento de óleo no litoral nordestino, com os incêndios no Pantanal, contra Ricardo Salles (troféu O Exterminador do Futuro e preso pela natureza), em homenagem ao cacique Aritana (que morreu de Covid-19) ao fazer a releitura do quadro O Grito do Ipiranga.
Sua jornada é feita de abrir caminhos e fazer conexões. Sigamos com ele.
Abaixo, o painel pronto, mensagem forte na paisagem asfixiante do centro de São Paulo, e o post emocionante de Mundano em seu Instagram.
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