– Uma crônica de Otávio Azevedo –
Você está sendo picado por um mosquito. Quando percebe o delinquente pousado na sua pele, ele já se encontra com o rabo cheio de sangue – o seu sangue!
O pequeno demônio, ao perceber seus movimentos de pânico, liga os motores e sai voando serelepe.
Nesse ponto você se lembra das notícias do jornal que leu pela manhã e então o pânico se transforma em desespero. Logo você se imagina entrando nas estatísticas e na sua cabeça começa a soar uma sirene de ambulância.
Calma! Pode ser que o fugitivo seja um Culex quinquefasciatus (o pernilongo comum) e não o temido Aedes aegypti. Tudo que você precisa fazer é se acalmar e repassar a lista de características que o levem a identificar o diabo que lhe atacou. Quem sabe o agressor foi um Culex?… Nesse caso, você já sabe o pior que pode lhe acontecer: pele avermelhada, coceira e – se você tiver alergia – aqueles calombos que surgem na pele. Se for assim, agradeça: pior mesmo é se o agressor não deixar nenhuma lembrancinha visível. Vamos às diferenças.
TAMANHO: o Aedes mede de 5 a 7 milímetros sendo maior que o Culex que vai de 3 a 4 milímetros. Eu sei que é difícil medir um mosquito com uma régua, ainda mais em movimento. Mas você já deve ter noção do tamanho de um pernilongo comum (o Culex). O Aedes é maior, tem quase o dobro de tamanho.
COR: o Culex veste modelitos num marronzinho básico, meio sem graça. Já o Aedes traja elegantes conjuntos em faixas pretas e brancas intercaladas, imitando camisa de presidiário (lembra dos Irmãos Metralha?).
HORÁRIO DE ATIVIDADE: o Culex é um mosquito boêmio, sai para colher sangue após as 18 horas e durante a noite. Já o Aedes trabalha em meio-expediente, das 9h às 13h aproximadamente. Este é o horário de alerta.
SOM DURANTE O VOO: o Culex é aquele mosquito que tem som de mosquito. Ouviu aqueles zumbidos irritantes que você sabe imitar? É o Culex. O Aedes tem o motor silencioso: você não vai sentir a aproximação do perigo.
VELOCIDADE DE ESCAPE: aqui o Aedes leva uma enorme vantagem. Tem um motor supersônico equipado com processador Core i7 de última geração, de forma que não adianta tentar acertar o Aedes com raquete elétrica. Já o Culex, quando veio para o Brasil entrou pela Bahia onde adquiriu alguns hábitos modorrentos, além de que vem equipado com um processador Intel 286. Comparando os dois, o Culex é como um fusca e o Aedes uma Ferrari. Se for rápido, você consegue enfiar a mão no Culex. No Aedes é bem mais difícil.
LOCAL DE REPRODUÇÃO: o Aedes é um bicho limpo, coloca seus ovos em água comum, proveniente da chuva, da rega de plantas, etc. Dessa forma, qualquer recipiente que possa conter água funciona como berço para uma futura legião de aedezinhos. Já o Culex é sujo pra chuchu. Coloca seus ovos na água suja e contaminada, como a água de esgotos. Portanto, aquele buraco escuro com água fedorenta e poluída está mais para Culex do que para Aedes. Se quiser distância do Aedes, preste atenção em potinhos, pneus velhos, tampinhas, enfim, qualquer coisa que contenha ou possa vir a conter água.
PICADA: a picada do sugismundo Culex não poderia passar em branco: pele vermelha, coceira e calombos, como já foi dito. Já o Aedes chupa com classe e anestesia, e não deixa nenhum sinal na pele. O grande problema do Aedes é o que ele deixa SOB a pele.
RESISTÊNCIA DOS OVOS: os ovos do Culex murcham fora da água contaminada e tornam-se inviáveis. Já o Aedes coloca ovos blindados que duram até um ano e meio em ambiente seco. Tem gente dizendo que uma estratégia seria colocar propositalmente potes com água para as fêmeas do Aedes depositarem os ovos e depois despejar fora a água antes que as larvas se desenvolvam. Pelo que foi dito eu não recomendaria essa solução. O melhor mesmo é eliminar qualquer coisinha (ou coisona) que possa conter água parada.
CONSEQUÊNCIAS: o pior vem agora…
Uma picada de Culex, repetindo, no máximo traz coceira, calombos ou o avermelhado na pele. Ele também pode transmitir o verme da filariose (elefantíase), mas trata-se de uma doença não epidêmica e rara.
O Aedes iniciou como uma startup, lançando a dengue, que se tornou um enorme sucesso comercial. Em função disso, a Aedes & Cia criou novos produtos e agora oferece também a febre chikungunya e o zika. Ao entrar em contato com o Aedes você pode adquirir cada produto isoladamente ou em combos. Esconjura!
Quer saber? A coisa é séria. Colabore com a sua parte. O grande problema é o Aedes. Eu sei que rola o risco da gente também detonar o Culex nessa guerra e deixar as pererecas sem alimento. São os efeitos colaterais.
[Fontes de consulta: diversos artigos em jornais e revistas.]
Otávio Azevedo é engenheiro civil na cidade do Rio de Janeiro, RJ. O texto foi retirado do blog do autor.
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