A ação é uma das mais aguardadas e é o ponto alto da jornada, quando famílias camponesas, indígenas e autoridades fazem “chover juçara”. – Foto: Vinícius Carvalho
Da Página do MST A cooperação entre indígenas kaingang e guarani, com camponeses/as do Movimento dos Trabalhadores Rurais Rurais Sem Terra (MST) e órgãos públicos está devolvendo a palmeira juçara para a maior Terra Indígena do Paraná. Na manhã desta terça-feira (3), a Terra Indígena Rio das Cobras, em Nova Laranjeiras, região centro do Paraná, recebeu a semeadura aérea de 2 toneladas de juçara, lançadas com apoio de um helicóptero da Polícia Rodoviária Federal. A espécie está entre as ameaçadas de extinção na Mata Atlântica.
A ação faz parte da 3ª Jornada da Natureza, iniciativa organizada pelo MST em cooperação com diversos órgãos públicos, entre os dias 2 e 7 de junho. Os lançamentos desta terça foram os primeiros desta edição, e seguem nesta quarta, em Quedas do Iguaçu, e nesta sexta, em Antonina (confira a programação completa abaixo). Dezenas de comunidades da reforma agrária do Paraná também realizaram ações ao longo deste período, somando o total de 21 toneladas de sementes de juçara semeadas no estado.
A semeadura massiva da Juçara representa a retomada da presença da palmeira na aldeia, praticamente extinta no território. Adelar Fagpri Felix Manduca, indígena Kaingang presidente da Associação Terra Indígena Rio das Cobras (Atirc), a Jornada da Natureza é um marco na luta contra o desmatamento. “Eu nasci e me criei aqui, nunca vi uma ação ambiental desse tamanho, em nenhum governo”, garante ao falar da proporção da atividade.
Na edição do ano passado, a comunidade recebeu a semeadura de uma tonelada de sementes da palmeira. “Se a natureza morrer, morre o indígena. E se o indígena morrer, morre a natureza. A gente faz parte de todo esse ecossistema, então a gente tá aqui pra preservar”, disse.
A liderança indígena reforça a importância da aliança com o MST, em especial nesta região do estado, onde está a maior Terra Indígena e a maior área contínua de assentamentos e acampamentos da Reforma Agrária do Paraná, no centro do estado, que reúne quase 5 mil famílias camponesas: “Tem tudo a ver com nós, são os parceiros de luta nossa”.
Foto: Diangela Menegazzi
O comandante Kunen, da Polícia Rodoviária Federal, pilotou pelo terceiro ano consecutivo a aeronave que carregou as sementes lançadas. Antes do primeiro sobrevoo, Kunen falou da satisfação em novamente fazer parte da operação e da importância da aliança entre os órgãos como a PRF, o Ibama, junto com o MST, para a realização da ação. “A semeadura aérea imita o que a própria natureza faz. Estamos aqui utilizando o máximo possível de tecnologia, e o ser humano dedicado em restabelecer a natureza”.
Os sobrevoos são o momento mais aguardado da ação, quando famílias camponesas, indígenas e autoridades fazem “chover juçara”. É o que reforça o superintendente do Ibama no Paraná, Ralph Albuquerque, que também participa desde a primeira edição: “O elemento fundamental da Jornada da Natureza está nesse sobrevoo, nessas mudas, nos hectares que são plantados. A riqueza está nesse processo”.
Para ele, esse plantio em Rio das Cobras tem sentido de reconstrução. “É com muito respeito que a gente vem aqui, porque é um território que no governo passado amargava as maiores taxas de desmatamento, e a gente conseguiu virar essa chave”, disse. Em parceria com o Ibama, a comunidade é a primeira do país a ter uma Brigada Prevfogo formada integralmente por indígenas. O objetivo é prevenir e combater incêndios na região e também fortalecer ações ambientais.
Foto: Ednubia Ghisi
Este é o segundo ano em que a TI Rio das Cobras participa da Jornada da Natureza. – Foto: Diangela Menegazzi
Por ser uma planta nova para os indígenas da região, a Jornada da Natureza também promove articulação com a universidade a fim de garantir cuidado adequado das plantas a partir do plantio. Adelar Fagpri Felix Manduca, da Atirc, explica que além da técnica de manejo, deve ocorrer um processo de conscientização.
“O objetivo dessa oficina é fazer o acompanhamento e mostrar para os nossos indígenas qual a importância da palmeira juçara”, explicou Adelar, “conscientizar o nosso povo para não extrair o palmito, mas o fruto, gerando renda e também a soberania alimentar”, resumiu.
Além dele, a indígena Ilda Cornélio também participou da ação, e estava no helicóptero durante um dos sobrevoos. Ela disse que era um sonho de criança voar de helicóptero e que pode ver a sua comunidade de cima pela primeira vez. “Era um sonho desde criança, quando a gente via os helicópteros pousando aqui a gente ficava naquela expectativa, como será que é ver a aldeia de cima?”, relembrou. “E foi muito bom, vai ficar na memória o resto da vida”, disse.
Ilda Cornélio (a esq.) viu pela primeira vez sua comunidade de cima. Ela contou que esse era um sonho de criança. – Foto: Diangela Menegazzi
A Universidade Federal da Fronteira Sul do campus Laranjeiras do Sul é parceira permanente das comunidades indígenas e camponesas da região, com pesquisas e orientação técnica para as comunidades. Fabio Zeneratti, professor da universidade, falou sobre o esforço em garantir o compromisso da instituição com a agroecologia e o envolvimento direto com as comunidades da reforma agrária e os povos tradicionais. “Nós vamos investir na pesquisa para que o que nós estamos projetando aqui ganhe visibilidade, ganhe uma dimensão maior do que já tem. Queremos investir para avançar na pesquisa, na tecnologia, esse é o projeto de futuro da nossa sociedade”, garante.
Se depender da deputada do Rio de Janeiro Marina do MST, a Jornada da Natureza e a metodologia da semeadura aérea com apoio de helicópteros vai para além das fronteiras do Paraná. Ela esteve na Jornada da Natureza para conhecer de perto a iniciativa que pretende fomentar na região de Paraty. “O meu objetivo hoje foi conhecer o processo de construção [da Jornada da Natureza], dos atores envolvidos, da escolha do território, de onde vem as sementes”.
Nascida em Guaraniaçu, Oeste paranaense, a parlamentar começou sua militância no MST no município de Ibema, e após mais de 20 anos de atuação no Rio de Janeiro, tornou-se a primeira mulher deputada estadual do MST eleita no Brasil.
No ano passado, a deputada apresentou à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro um projeto de lei que declara a palmeira juçara como patrimônio material do estado fluminense. “Eu acredito que essa é uma grande contribuição que nós estamos dando para a preservação e recuperação da natureza, e para a segurança e soberania alimentar”.
Outras dezenas de ações vão acontecer em diversos municípios do estado, voltadas diretamente aos camponeses/as: são cerca de 20 oficinas e atividades práticas de recuperação de nascentes e de áreas degradadas, produção em agrofloresta, manejo e proteção do solo, homeopatia na Produção Animal, produção de mudas de erva mate, prevenção à deriva de agrotóxico e à influenza aviária, entre outras.
O encerramento da Jornada terá como ação principal a inauguração de um viveiro de mudas e horto medicinal no assentamento Contestado, na Lapa. O viveiro terá capacidade para produção de 100 mil mudas por ano, com foco em espécies da floresta ombrófila mista, a conhecida floresta de araucária. Já o horto de plantas bioativas prevê a produção de 5 mil mudas por ano, além de ser espaço pedagógico para o aprendizado para o cultivo de matrizes, manejo e propagação das espécies e produção de matéria-prima para fitoterápicos. Esta ação integra o projeto Bem Viver, que desenvolve capacitações e implantação de práticas agroecológicas e agroflorestais, em todo o estado. O projeto é resultado da parceria entre o Instituto Contestado de Agroecologia (ICA) e a Itaipu Binacional, por meio do Programa Mais que Energia, alinhado ao governo federal.
A 3ª Jornada da Natureza é organizada em parceria com a Associação de Cooperação Agrícola e Reforma Agrária do Paraná (ACAP); Cooperativa Central da Reforma Agrária (CCA); Polícia ROdoviária Federal (PRF); Instituto Contestado de Agroecologia (ICA), a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Campus Laranjeiras do Sul; Laboratório Vivan de Sistemas Agroflorestais; Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB); Instituto Água e Terra; Centro de Desenvolvimento Sustentável e Capacitação em Agroecologia (CEAGRO); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama); Comitê de Cultura do Paraná; Prefeitura de Quedas do Iguaçu; Fundação Luterana de Diaconia (FLD); e Associação de Produtores Orgânicos de Quedas do Iguaçu Produzindo Vidas (APOQI). Este ano, mais uma vez, a Caixa Econômica e o Governo Federal são patrocinadores do evento.
> 02/06 – Comunidade Dom Tomás Balduíno (Quedas do Iguaçu – PR): Seminário “A pesquisa científica sobre a Palmeira Juçara na Reforma Agrária”
8h: Café da manhã 9h: Seminário “A pesquisa científica sobre a Palmeira Juçara na Reforma Agrária” 12h30: Almoço comunitário (trazer pratos e talheres) 13h30: Visita técnica às áreas semeadas e na Agroindústria 16h: Café e Encerramento
> 03/06 – Comunidade Indígena Rio das Cobras (Nova Laranjeiras – PR): Semeadura aérea de 2 toneladas de Palmeira Juçara
9h: Apresentação cultural e recepção das lideranças indígenas do Paraná 9h30: Sobrevoo para semeadura de 2 toneladas de sementes de palmeira juçara 10h: Reunião das lideranças e entrega das pautas indígenas 11h30: Ato Político 13h: Almoço comunitário (trazer pratos e talheres) 15h: Distribuição das sementes à TI Rio das Cobras
> 04/06 – Comunidade Dom Tomás Balduíno (Quedas do Iguaçu – PR): Semeadura aérea de 8 toneladas de Palmeira Juçara
9h: Início do sobrevoo para lançamento das 8 toneladas de sementes 10h: Visita técnica de pesquisadores e autoridades às áreas semeadas e Exposição ambiental na Escola Itinerante Vagner Lopes. 11h30: Ato Político da 3ª Jornada da Natureza 13h30: Almoço comunitário (trazer pratos e talheres) 15h: Continuação do sobrevoo para lançamento de sementes 16h: Matibaile
> 05/06 – Dia Mundial do Meio Ambiente: Comunidade Herdeiros da Terra 1º de Maio (Rio Bonito do Iguaçu – PR): Recuperação ambiental de 7 hectares de Reserva Legal
8h: Café e acolhida 9h: Ato Político e Mística do grande mutirão de reflorestamento da 3ª Jornada da Natureza 10h30: Plantio de mudas de árvores nativas 13h: Almoço comunitário (trazer pratos e talheres)
> 06/06 – Comunidade José Lutzenberger (Antonina – PR): Semeadura aérea de 1 toneladas de Palmeira Juçara
10h: Conferência Formativa da Mata Atlântica 11h: Sobrevoo para semeadura de 1 toneladas de semente de palmeira juçara 13h: Almoço caiçara (trazer pratos e talheres) 14h às 16h: Oficina de música e conhecimentos do território litorâneo 14h às 16h: Plantio no Bosque Comunitário e Atração Cultural
> 07/06 – Assentamento Contestado (Lapa – PR): Conferência “A dimensão ambiental da Reforma Agrária Popular” e Inauguração do Viveiro de Mudas de Horto Medicinal
8h: Café e acolhida 9h: Conferência “A dimensão ambiental da Reforma Agrária Popular” 11h: Inauguração do Viveiro de Mudas e Horto Medicinal e 1º Mutirão de semeadura e plantio do viveiro 13h: Almoço comunitário (trazer pratos e talheres)
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