As desigualdades entre mulheres e homens é visível em diversos setores da sociedade. Apesar dos avanços, as mulheres ainda são menos reconhecidas na ciência, são sub-representadas na política, e, no mercado de trabalho, ainda recebem menos que os homens quando exercem a mesma profissão. O mundo da música parece não ser diferente: as mulheres ainda sofrem preconceito e desafios como produtoras, intérpretes e, principalmente, compositoras. Segundo o relatório “Por elas que fazem a música”, da União Brasileira de Compositores (UBC), entidade que administra direitos autorais do país, as mulheres recebem, em média, 28% menos que os homens com direitos autorais. Além disso, entre os 100 maiores arrecadadores, apenas 10 são mulheres.
Ao apontar a origem dos rendimentos, os dados da pesquisa apontam que os recebimentos como intérpretes possuem o dobro de importância econômica para as mulheres. Para os homens, o destaque dos recebimentos vai para os trabalhos autorais, o que confirma o fato de ainda ser raro as mulheres que são devidamente reconhecidas no mercado de trabalho como compositoras. “É mais comum compositores homens, de choro, samba, da música brasileira como um todo. A gente vê muitas intérpretes, cantoras… acho que o canto é o meio em que as mulheres ganharam mais força. A gente vê poucas instrumentistas e compositoras, mas elas existem”, afirma a flautista e compositora Marcela Nunes. Na opinião da musicista e compositora mineira Deh Mussulini, essa situação é fruto de uma cultura muito forte do machismo, que cria uma tendência das pessoas divulgarem e se interessarem mais pelos trabalhos dos homens. “Quando a mulher aparece como intérprete, o corpo dela é o próprio instrumento. Ela é o que tem que ser pela sociedade: bonita, que seduz. Não que isso seja ruim, mas limita a mulher nesse lugar. A gente sempre apareceu como musa inspiradora para os homens. Quando a mulher aparece como instrumentista, ela ainda provoca algo de sedução por estar ali presente, mas já causa menos interesse. Quando aparece como compositora, aí ela não tem vez. A mulher não é vista como criadora, pensadora, mas como alguém que, no máximo, vai replicar o que já está pronto”, discute Deh. Dia a dia – Marcela, que começou a estudar música ainda criança, percebe na pele o machismo e o preconceito em seu meio de trabalho, que é o choro e o samba. “Toda arte de um povo reflete uma coisa que já existe. Muitas vezes, a mulher está lá não porque toca, canta ou compõe bem. Mas porque ela vai ‘enfeitar’ a banda. A gente tem que provar dez vezes mais que faz as coisas bem”, critica a musicista, que toca flauta transversal há 20 anos e hoje enfrenta o desafio de conciliar a carreira com o exercício da maternidade. A instrumentista Sol Bueno, que compõe com viola caipira há 8 anos, conta que começou, ainda criança, como compositora. Atualmente, Sol possui trabalhos autorais e, assim como Marcela, afirma que em seu meio de trabalho também se reproduz o machismo e preconceito contra as mulheres. “É muito difícil ocupar espaços que para alguns é só chegar e tocar. Você tem que ficar convencendo que sabe, tem que falar, brigar, passar por assédio. Por outro lado, me dá uma esperança muito grande de sentir como que a presença de outras mulheres foi um acalento para eu me fortalecer na minha profissão”, sustenta. Mulheres que criam – Deh Mussulini é idealizadora do coletivo Mulheres Criando, de Belo Horizonte, que tem como objetivo dar visibilidade aos trabalhos autorais de mulheres musicistas, por meio de festivais e mostras. Para conhecer mais, clique aqui. ____________________________________ Larissa Costa/BrasildeFato
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