Olho em retrospectiva o ano que passou e percebo que esta é a hora e a vez da necedade. Fosse vivo, o historiador Eric Hobsbawm talvez escrevesse a Era do Hebetismo, para narrar a triste verdade da escassez de cérebros em nosso tempo. Mas o dele, como o do Millôr, é um dos que se vão para contribuir com a rápida redução do tino neste mundo de Deus dará.
Aqui, cada vez mais, a idiotia é onipresente, onipotente e – quem diria? – onisciente. Duvida? Provo.
Não há quem não conheça um idiota. Ele está em toda a parte. Anda pelo mundo a sugerir supressões aos textos de Dante e Monteiro Lobato e a apedrejar meninas no Afeganistão e em Santa Catarina. Ocupa cargos públicos ou segue a vida comum. Mora na Cochinchina ou é seu vizinho de porta. Não há posição social ou nacionalidade reservada ao idiota.
Não é à toa que todo e qualquer cronista tem um personagem, ao menos, que é a caricatura do apalermado. Na maioria das vezes, figura recorrente. Claro, porque se a crônica é a vida em texto, como escapar de falar do néscio?
Não, nem na ficção. Verdade já foi dita que a inteligência é o bem melhor distribuído na face da terra: todos estão satisfeitos com a sua. Apesar disso, ou talvez até por isso, o idiota se prolifera tão rápido quanto os perfis no Facebook e com tanta veracidade quanto os reality shows da moda. A idiotia é onipresente.
E onipotente! Despropósitos, sandices e tolices tem cada vez mais lugar no mundo. Tudo podem os disparates naquele que os fortalece: o perfeito idiota. Sim, há muitos tipos de parvos e o perfeito idiota é o maior de todos. Aquele que se crê sábio. O idiota professoral.
Porque o idiota não é o analfabeto. Não, não se confunda. Bem descreveu Nelson Rodrigues. O pior é o analfabeto que sabe ler, sabe escrever e sai a escrever asneiras. É o sub intelectual a que Nelson chamou de cretino fundamental.
Mas há outros, a idiotia é pestilenta. Basbaques distribuem-se pela natura a atazanar a vida dos dotados de neurônio. O Anjo Pornográfico distinguiu ao menos mais dois: o idiota da objetividade e vizinha gorda e patusca, que saca da manga um lugar comum a cada esquina.
Antônio Maria também se aventou no mundo a nescidade, descreveu com genialidade o homem autobiográfico do “bom chuveiro” e “da família”. Como a vizinha gorda e patusca, o homem autobiográfico é refém da frase feita. Dita e reedita tudo o que há de saber comum e de trivialidade. É grande conhecedor de tudo o que todos já sabem.
É a onisciência da idiotia. O perfeito idiota tudo sabe e melhor que o próximo. Pode ser reconhecido pela boca cheia com que vomita sua ignorância. Rei do parlatório, não há limites para sua pretensa sapiência.
E não me venha você dizer que o estúpido é um coitado, um doente social, um desprovido de oportunidades. Antes de dar uma de idiota da objetividade, pense bem no seu estulto predileto e veja se não tenho razão. Esta é a vez e a hora dos ignaros. Salve-se quem puder.
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