Grupo de docentes e estudantes da Unila se reúne com presidente da Câmara de Foz do Iguaçu – Divulgação
Em 2025 serão comemorados os 100 anos da Coluna Prestes, a marcha político-militar liderada por Luís Carlos Prestes que, de 1924 a 1927, percorreu 25 mil quilômetros ao redor do Brasil em defesa da educação, da democracia e da reforma agrária. Com a data em mente, um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Integração Latino-Americana (Unila), com campus na cidade de Foz do Iguaçu (PR), fará seminários nacionais e internacionais, além de propor que a Câmara Municipal torne o 24 de abril o Dia Municipal da Memória e Resistência. Foi nessa data, em 1925, que o movimento chegou ao município.
Foz do Iguaçu foi palco de um momento crucial da marcha, que reuniu cerca de 1,5 mil pessoas ao longo de dois anos e meio. Foi ali que as forças comandadas por Miguel Costa, vindas de São Paulo, juntaram-se às tropas de Prestes, que vinham do Rio Grande do Sul.
“Foi aqui [Foz do Iguaçu] que teve início a caminhada em direção ao interior do país”, explica Renato Martins, docente de Ciência Política e Sociologia da Unila e coordenador do grupo de pesquisadores.
“Daqui partiram para conquistar o restante do país, percorrer 25 mil quilômetros pelos sertões até se dispersar na Bolívia”, conta o professor. “Uma marcha que, tendo percorrido uma extensão tão grande como essa, nunca foi derrotada militarmente”, complementa.
O grupo coordenado por Martins se prepara para realizar eventos em parceria com pesquisadores da Universidade Estadual do Oeste (Unioeste) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
“Muito já se disse a respeito da Coluna Prestes no Brasil, mas pela primeira vez a gente reúne um grupo de pesquisadores com tantos representantes de países latino-americanos”, destaca Martins, ao citar Paraguai, Argentina, Colômbia, Peru, Cuba e Haiti.
“Coluna Prestes”, pintura de Cândido Portinari, 1950 – Reprodução
Formalmente chamada de 1ª Divisão Revolucionária, a Coluna Prestes foi a principal expressão do movimento tenentista e visava derrubar, por meio das armas, o regime oligárquico do governo de Artur Bernardes.
Com soldados compostos especialmente por trabalhadores do campo, em sua maioria analfabetos, a marcha reivindicava o ensino público e, em especial, o ensino secundário para toda a população. Além disso, defendia a reforma agrária e a implementação do voto secreto.
Sob essas pautas, a coluna atravessou 13 estados brasileiros. Em meio à esmagadora maioria de homens, 50 mulheres compuseram as tropas, quase todas vindas do estado gaúcho. “A coluna foi uma marcha única na história mundial”, resume Martins.
“Essas palavras de ordem soam muito familiares nos dias de hoje”, opina o professor da Unila. “Eram a favor da educação pública, que à época se expressava sobre a forma do combate ao analfabetismo, sobretudo rural. A favor da democracia, especialmente contra as fraudes eleitorais, que era o sistema de preservação dos poderes locais, dos coronéis, do chamado ‘voto de cabresto’, que permitiu o revezamento das oligarquias paulistas e mineiras”, elenca.
“E a pauta também ainda atual, que concerne diretamente ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que é a distribuição de terras no combate ao latifúndio, a reforma agrária”, salienta Martins.
É por isso que, segundo o docente, a ideia é incorporar movimentos populares nas ações envolvendo o centenário da Coluna Prestes.
Uma das próximas atividades do grupo será uma visita a um obelisco na cidade de Santa Helena junto com lideranças de assentamentos do MST na região. A coluna passou por ali na década de 1920, quando fugia de tropas governistas. O bairro a ser visitado, Ponte Queimada, leva esse nome por conta da tática usada pelos revolucionários para dificultar a perseguição.
Para o ativista, jornalista e escritor Aluízio Palmar, “não se explica que não haja nenhum sítio de memória que registre esse episódio tão relevante da nossa história em um local público”. Também membro do grupo que prepara o centenário – como pesquisador, mas também como fonte – Aluízio vive 50 dos seus 81 anos em Foz do Iguaçu.
Antes de se estabelecer na cidade de tríplice fronteira, Palmar teve uma vida atribulada. Autor do livro Onde que vocês enterraram nossos mortos?, militou na luta armada contra a ditadura empresarial-militar brasileira.
Em 1967, fundou o Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8). Preso dois anos depois e resistindo a torturas no DOI-CODI, conseguiu se exilar do país quando, em 1971, foi liberto junto com outros 69 presos em troca da soltura do embaixador da Suíça no Brasil.
No Chile, entrou na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e voltou ao Brasil para atuar na região do Alto Rio Uruguai. Palmar viveu na clandestinidade até a anistia, em 1979. Atualmente, está à frente do site Documentos Revelados, que reúne documentos históricos a respeito da ditadura brasileira.
“Hoje, aqui na cidade [Foz do Iguaçu], Palmar sempre teve uma presença do lado das lutas e dos movimentos sociais. E, para nós, é uma honra tê-lo como um dos membros do nosso grupo de pesquisa”, ressalta Renato Martins.
Assine as notícias da Guatá e receba atualizações diárias.