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Segundo Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, o tanto de bibliotecas públicas brasileiras fechadas revela um desinvestimento na cultura e na educação: “As bibliotecas públicas em muitos municípios são um elo fundamental da cultura. Podem ter nessas bibliotecas ações culturais muito importantes para a formação do indivíduo, para o desenvolvimento da sua cidadania”. Algumas das atividades promovidas são saraus literários, recitais, musicais e peças.
As bibliotecas públicas também são importantes para a memória brasileira por guardarem a literatura e a informação e história local a partir dos livros físicos e de projetos internos para contar e recitar histórias.
Para Cibele, é necessário garantir investimentos e legislações a favor de manter as bibliotecas públicas abertas, conservando seus espaços de união social e a cultura do País:
A gente tem que ter uma pauta de defesa perante os prefeitos, governadores, vereadores e deputados. Investimento na cultura não é custo, é benefício puro para ter uma sociedade mais desenvolvida.”
. Ela completa afirmando que é uma defesa que precisa partir de várias instâncias, pelos cursos de Biblioteconomia nas universidades, pelos conselhos profissionais e associações e federações. “Um trabalho quase de formiguinha, de fazer a defesa dessas instituições, olhando a biblioteca com uma importante instituição de informação e cultura”, afirma.
Ouça abaixo a entrevista com Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP, sobre as bibliotecas públicas:
De acordo com o Anuário Brasileiro de Educação Básica de 2021, uma ferramenta de consulta sobre o panorama do ensino no País, infraestruturas essenciais na aprendizagem, como a biblioteca, ainda não estão presentes na maioria das escolas brasileiras. As bibliotecas escolares diferem das públicas por serem um equipamento intrinsecamente ligado à cultura e ao processo de ensino-aprendizagem por meio de recursos educativos para estudo, encontro e lazer.
Apesar da universalização das bibliotecas escolares decretada na Lei 12244/10, a demora na sua efetivação preocupa o acesso a elas: “Em 2010, a gente tem que propor uma lei para exigir a existência de bibliotecas nas escolas. Isso já é uma coisa alarmante”, reflete Ivete Pieruccini, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP. Doze anos depois, o fechamento desses ambientes sinaliza uma falta de investimento na relação entre o aluno brasileiro e a biblioteca.
Além da quantidade, a configuração dos espaços também é tema de receio. A percepção diluída da biblioteca como uma instituição de organização, oferta e distribuição de informação não contempla a complexidade do papel cumprido por elas em contextos educativos. Segundo Ivete, no universo da comunidade escolar, as bibliotecas são responsáveis por autores dos processos de formação de pensamento da sociedade. “A responsabilidade dessas instituições não é uma responsabilidade meramente técnica. Elas têm um comprometimento social. Bibliotecas são instâncias de caráter político”, comenta.
Biblioteca escolar – Foto: Wikimedia Commons
O interesse de cada população com a biblioteca determina também a abordagem das estruturas e ferramentas disponibilizadas aos sujeitos que ocupam esses espaços. A professora considera que as particularidades da sensação de pertencimento à biblioteca e à leitura devem ser interrogadas: “O que ele vai fazer com aquela leitura? Com quem ele vai conversar? Onde ele vai desenvolver ideias? Onde ele vai expandir o pensamento a partir daquela leitura?”, elabora sobre o aluno que visita o ambiente.
Ao contrário de uma ótica reducionista, o papel de bibliotecas em escolas de comunidades com interesses e identidades diversificados implica repertórios locais repassados por gerações através da memória. “Quanto menos acesso a essa memória que está no conhecimento acumulado pela humanidade, quanto menos acesso [às bibliotecas escolares] a juventude tem, mais ela se torna desconectada do mundo que ela vive” afirma Valdir Heitor Barzotto, professor e vice-diretor da Faculdade de Educação (FE) da USP. Para ele, ao permitir o acesso a conhecimentos distantes em tempo e espaço, as bibliotecas provocam os jovens a construírem sua própria prática cotidiana.
Com o fechamento das escassas bibliotecas, a biblioteca como um espaço de acesso público, livre e gratuito é um princípio a ser defendido, na visão de Barzotto. “Não há outro espaço mais livre do que a biblioteca. A biblioteca garante que esse conhecimento seja de acesso ao público e que não vire mercadoria”, reforça ele. Com o conhecimento acumulado, o jovem encontra a si mesmo na leitura e como agente na reinvenção de sua prática.
O sumiço desses espaços de educação também tem como um dos impactos a situação financeira, uma vez que, com a falta de acesso ao ambiente, o leitor vai sendo incitado a suspender ou a pagar pela prática de atividades de formação cultural. Sobre a pressuposição da qualidade ser proporcional ao preço, o professor declara: “Cada vez mais tem esse investimento do mercado em transformar um conhecimento em mercadoria e é importante fechar a biblioteca”.
Essa ‘mercadorização’ do conhecimento, a transformação do conhecimento em objeto de consumo mediante pagamento, faz com que o leitor, agora transformado em consumidor, não se sinta mais desafiado a entender a dimensão de uma unidade que está nele, de se comprometer em deixar um conhecimento mais avançado para as gerações que virão, a produção de novos conhecimentos ou de uma transformação da sua própria prática”, conclui.
Ouça abaixo a entrevista com Ivete Pieruccini, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP, e Valdir Heitor Barzotto, professor e vice-diretor da FE-USP:
Ônibus da Cultura – Foto: Prefeitura de São Paulo
“São acervos de bibliotecas estabelecidas e organizadas por alguma instituição, uma ONG, ou até uma biblioteca comunitária”, define Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP. Para serem consideradas bibliotecas como a biblioteconomia conceitua, as bibliotecas circulantes precisam conservar as funções fundamentais de organização, gestão e mediação da informação por parte de bibliotecários regulamentados.
Um exemplo de programa itinerante é o Ônibus-Biblioteca, hoje com o nome de Ônibus da Cultura, da Prefeitura da cidade de São Paulo, criado em 1935. Os ônibus fazem doze roteiros. Com a pandemia, as atividades foram suspensas e ainda não foram retomadas.
Também existem pontos fixos de troca de livros em áreas como pontos de ônibus e shoppings. Uma questão a se atentar nessas ações é a qualidade das informações que estão circulando, se não contarem com nenhum tipo de mediação. “As bibliotecas primam porque elas fazem uma certa seleção de material”, afirma Cibele. Não deve haver preconceitos nesse processo de seleção, mas critérios definidos para filtrar a informação. “Notícias falsas não poderiam, um documento, um livro inteiro que fosse construído dentro dessa ideia não seria admissível numa biblioteca.”
Ouça abaixo a entrevista com Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP, sobre as bibliotecas circulantes:
Em meio à crescente digitalização, os bibliotecários se adaptaram e assumiram várias funções no mundo digital, assim como aconteceu em outras profissões. Sendo responsável pela organização da informação, esse profissional trabalha com todos os formatos em que ela se apresenta.
“O perfil do bibliotecário mudou sim, porque o bibliotecário é preparado para trabalhar a informação com todos os tipos de formatos e mídias, inclusive os audiovisuais, eletrônicos e digitais”, afirma Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP. Cada meio atende a um público específico, e o bibliotecário pode escolher a qual se dedicar. “Eu costumo dizer que um formato novo não inviabiliza o anterior, a gente viu isso acontecer com o teatro, o cinema e o livro.”
O bibliotecário também faz a gestão dos centros e sistemas informacionais, como as bibliotecas, e fornece orientações para as pessoas encontrá-las. Para Cibele, a posição que o profissional assume determina a percepção de seu sucesso: se ele trabalha com a gestão de mídias sociais de empresas, por exemplo, ou com a conservação e restauração de material bibliográfico. “É quase uma opção artística de trabalhar com essa conservação, e, por incrível que pareça, isso está em alta, por assim dizer, porque nós temos poucas pessoas especializadas na preservação e conservação do material bibliográfico.”
O combate à desinformação é outra área onde o bibliotecário pode contribuir, a partir do desenvolvimento da percepção crítica da informação, a chamada competência informacional. “Somos orientadores para checar fontes.”
Por outro lado, a ideia de que as oportunidades para o bibliotecário estão diminuindo responde à visão da sociedade sobre a cultura. “Acho que a gente tem muito mais um reflexo de como está a sociedade, como está o olhar político-econômico com relação à cultura propriamente dita”, afirma Cibele. “O bibliotecário também é um profissional que está trabalhando na cultura.”
Ouça abaixo a entrevista com Cibele Araújo, professora do curso de Biblioteconomia da ECA-USP, sobre o perfil do bibliotecário:
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