Um dos poucos registros que existem da presença de Ivone Lara como enfermeira no Hospital Engenho de Dentro – Foto: Arquivo familiar
Não existem registros fotográficos, gravações em vídeo ou áudio que provam que Nise da Silveira e Dona Ivone Lara trabalharam juntas no Hospital Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro.
Junto com a artista Pâmera Carmo, as duas montaram uma exposição, em cartaz em Mogi das Cruzes – SP, que revela detalhes do trabalho realizado no Hospital Engenho de Dentro, espaço percursor da Luta Antimanicomial no Brasil.
No final da década de 1970 diversos movimentos populares e profissionais ligados à saúde mental passaram a fazer denúncias quanto ao tratamento de pacientes em hospitais psiquiátricos do Brasil. A partir dessas queixas, começou a exigência por cuidado com pessoas em sofrimento mental, e a necessidade de uma reforma psiquiátrica foi colocada em questão.
“Quem não tinha nenhuma questão mental, nenhum transtorno, invariavelmente acabava ficando com alguma questão após passar por tratamentos terríveis, como tinham na época de Nise da Silveira e de Dona e Ivone Lara, como o eletrochoque e a lobotomia”, explica Mattos sobre práticas de dar descargas elétricas em pacientes ou fazer cortes no cérebro.
“Dona Ivone, com seus 20 anos de idade, era a enfermeira Ivone e teve esse encontro muito potente, poderoso entre duas mulheres revolucionárias”, conta Pâmela Carmo sobre como as duas mulheres se conheceram.
Muito antes de Ivone Lara se tornar a grande sambista que foi, “Nise percebe esse talento e essa sabedoria da Dona Ivone com a música. A Dona Ivone compunha música com os clientes, realiza saraus, a pedidos de Nise”, complementa Carmo.
Ivone Lara marcou a história do samba de diversas formas e foi a primeira mulher a integrar a ala de compositores da Império Serrano, tendo assinado a composição do samba-enredo Os Cinco Bailes da História do Rio, de 1965.
Em sua homenagem, neste ano, foi assinada uma lei que transforma a data do seu nascimento, 13 de abril, como dia da Mulher Sambista.
Depois do hospital Engenho de Dentro, Ivone Lara e Nise da Silveira se separaram, mas, de certa forma, seguiram juntas na conquista de espaço de poder para mulheres dentro da sociedade brasileira
“Ivone Lara foi a primeira mulher que vai compor um enredo. Essa mulher que estava sempre com um cavaquinho na mão nas fotografias. A gente foi percebendo como Dona Ivone estava sempre no meio de muitos homens. Sempre ela com esse poder! E aí, quando a gente olha a Nise é a mesma coisa. Essa mulher no meio de muitos homens e a sua palavra ao contrário do que eles pensavam”, lembra Carmo.
“São tecnologias ancestrais e como a gente traz isso para a rua pro nosso corpo. Esse encontro foi a prova que o samba cura”, finaliza a artista.
Segundo Mattos, a ocupação Ivone & Nise: Um Reencontro nasceu para eternizar o legado da gigante cantora e compositora Dona Ivone Lara e sua atuação enquanto enfermeira, assistente social e terapeuta ocupacional, especificamente no período em que atuou na equipe da médica psiquiatra Nise da Silveira, no Hospital Psiquiátrico Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro.
Assine as notícias da Guatá e receba atualizações diárias.