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Nise da Silveira ficou conhecida por seu trabalho como psicoterapeuta e na Luta Antimanicomial – Foto: Arquivo Pessoal Nise da Silveira . SAMII
É necessário se espantar, se indignar e se contagiar, só assim é possível mudar a realidade.” – Nise da Silveira
Nise, ser mulher, ser rebelde
Doutora Nise da Silveira: mulher, cientista, revolucionária, psiquiatra e alagoana, entre tantas outras coisas que representou para diversas pessoas, durante toda a sua vida (1905-1999), lutou pela urgente necessidade de rever padrões da sociedade. Rebelde assumida, tinha o afeto como força motora de seus estudos e ferramenta de trabalho. Queria substituir doentes dopados e alienados por pessoas integradas, assistidas e tocadas, ou seja, afetadas. Em vez de choques, a “Emoção de Lidar” e a adoção das artes como método de tratamento. E, definitivamente, a substituição do encarceramento pela liberdade.
. Sua história, ainda longe de chegar ao fim, é marcada por resistência e luta, sempre amparada na ciência, mas sem permitir que a racionalidade excessiva deixasse de fora o afeto e a escuta. Hoje, celebramos a doutora Nise não como um monumento à psiquiatria brasileira que, naturalmente, ela recusaria, mas como referência de que é possível fazer do mundo um lugar mais humano.
A exposição “Nise da Silveira – A Revolução pelo Afeto”, numa versão virtual, dispõem de informações sobre a vida e a obra da médica psiquiatra e reproduções de obras que fazem parte do Museu de Imagens do Inconsciente. A exposição reproduz o que foi a exposição presencial realizada no Centro Cultural Banco do Brasil no segundo semestre de 2022. Para acessar, clique, aqui.
Pintura de Emydgio de Barros está entre as obras de ex-pacientes da psiquiatra – Divulgação/CCBB-RJ
. A exposição está dividida em três grandes núcleos e começa pela sala Contexto, Dor e Afeto. Em seguida, os visitantes passam para o espaço Atelier, onde é possível conhecer um pouco da vida, das pesquisas e do trabalho de Nise, que morreu aos 94 anos, em 1999, e que ficou mundialmente conhecida por revolucionar e humanizar o tratamento psiquiátrico.
A exposição do CCBB-RJ exibe mais de 100 obras, das quais 90 são oriundas do Museu de Imagens do Inconsciente. Dentre as obras contemporâneas, há trabalhos de fotografia, vídeoinstalação, escultura, além de reproduções históricas de arquivo. Há referência ainda a livros escritos pela psiquiatra, entre os quais o último, Cartas a Spinoza, que foi um filósofo contemporâneo do francês Descartes e que, ao contrário deste, pregava que a ciência se faz também com afeto e com amor e não só só com razão.
O museu tem um acervo de 400 mil trabalhos variados, registrados como patrimônio. Desse total, foram escolhidas para a exposição telas de Carlos Pertuis, Fernando Diniz, Adelina Gomes, Emygdio de Barros e Arthur Amora. Entre os pacientes contemporâneos, está Albertina da Rocha.
Exposição pode ser vista no formato virtual, num passeio em 3D pelas salas do centro cultural / Divulgação/CCBB
O Museu de Imagens do Inconsciente, de onde vieram as obras para o CCBB-RJ, foi criado por Nise em 1952 e está localizado no bairro do Engenho de Dentro, na zona norte da capital fluminense. Na época, a psiquiatra tinha o objetivo de reunir os trabalhos produzidos pelos seus pacientes nos estúdios de modelagem e pintura, revelando de forma profunda tudo o que se passava no universo interior deles.
Segundo explicou o curador e produtor da mostra, Diogo Rezende, a passagem dos 22 anos de morte de Nise da Silveira este ano foi o principal estímulo para propor o projeto da mostra. O Museu de Imagens do Inconsciente ajudou a construir o projeto, explicou o curador.
A médica psiquiatra alagoana foi a única mulher a se formar em uma turma com mais de 150 homens. Nise da Silveira ficou mundialmente conhecida pela ideia vanguardista de usar o afeto como metodologia científica no tratamento de pessoas com problemas psíquicos.
O psiquiatra Vitor Pordeus, que trabalhou no Instituto Municipal Nise da Silveira de 2009 a 2016, salientou que ao buscar formas de acessar as camadas do inconsciente e criar um diálogo entre o inconsciente e a sua expressão em imagens, por meio de ferramentas artísticas e com aplicações científicas, Nise acabou reformando o entendimento da loucura no mundo.
“A Nise criou um método clínico centrado no afeto. Ela é herdeira de Juliano Moreira, de Baruch Espinoza, de Sigmund Freud, de Carl Gustav Jung. Jung foi aluno de Freud e professor da Nise, na Suíça. Homens revolucionários, que abandonaram a ideia do corpo máquina e trabalharam com a abordagem centrada na subjetividade, na emoção, na identidade, na simbologia, nas narrativas que restauram as memórias. A nossa dificuldade hoje é não deixar o afeto se apagar, em um momento em que tudo virou máquina”, destacou Pordeus.
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