ATL é a maior mobilização de povos indígenas do país, primeira edição foi realizada em 2004 – Foto: Agência Brasil
Mais de 6 mil indígenas de 200 povos de todos os biomas do país participaram na manhã desta terça-feira (23) da primeira marcha do Acampamento Terra Livre 2024 (ATL). Os indígenas marcharam no Eixo Monumental, com saída da Torre de TV até o Congresso Nacional, e alertaram que os direitos dos povos originários “não se negociam”.
“Nosso território é nossa vida, estamos aqui para cuidar da terra, do meio ambiente, a terra para nós é sagrada, nós somos donos do Brasil, antes de chegarem aqui nós já estávamos com nossos cocares, nosso pé no chão, não vamos desistir”, disse Regiane Kaigang, de São Paulo.
Ela foi uma das muitas lideranças indígenas que discursaram no percurso da Marcha #EmergênciaIndígena para denunciar as violações contra os povos originários, a falta de demarcação dos territórios e pedir a inconstitucionalidade da Lei nº 14.701/2023, que regulamenta a tese do marco temporal.
Primeira marcha do ATL denunciou a Lei no 14.701/2023, que institui o marco temporal – Foto: Julio Camargo
Em manifesto divulgado na segunda-feira (22), primeiro dia do ATL, o movimento indígena apontou diversas reivindicações, entre estas a finalização do processo de demarcação das “23 Terras Indígenas cujos processos administrativos de demarcação aguardam portaria declaratória”.
“O ATL é a maior assembleia dos povos indígenas do Brasil, é o maior movimento dos povos indígenas do Brasil, e não tinha como nós, do sul do Amazonas, que lutamos há séculos por tudo que é de direito dos nossos povos, não estarmos aqui hoje. Então, nesses 20 anos de ATL, a gente veio lutando para que o nosso povo não perdesse a cultura, as tradições, que se mantivessem fortes e resistentes dentro do seu território, em busca de dar uma qualidade melhor de vida para os nossos povos, dentro do nosso território. Nós estamos aqui fazendo isso. Dizendo que existimos, que estamos resistindo e vamos existir”, destacou Mabel Apurinã, do Amazonas.
Em marcha, indígenas também denunciaram o desmatamento ambiental – Foto: Camila Araujo
Mabel Apurinã avaliou ainda a importância do ATL para a garantia de direitos dos povos originários.
“O pouco de direitos que nós temos, que ainda temos, é por causa desse movimento que estamos hoje. Porque se não fosse a junção, a mobilização, a força e a garra, nós não teríamos nada. Porque a cada dia, infelizmente, quem a gente coloca no poder para lutar por nós são as pessoas que lutam contra nós. Essa que é a realidade. A expectativa é que nós vamos continuar na luta e vamos resistir até o último indígena. E como há 500 anos nós lutamos, então esse dia nunca vai chegar, de ter o último indígena”, ressaltou.
Indígenas imigrantes que vivem no Brasil também participaram da Marcha. É o caso de Tania Sahire, indígena aymara com nacionalidade boliviana, que apontou as desigualdade sociais e a luta por reconhecimento desses povos.
“Desejamos participar do ATL como companheiras e companheiros de luta no território brasileiro, pois, apesar da diferença linguística e territoriais criados pela colonização e capitalismo, vivemos traços de consequências coloniais semelhantes com o racismo estrutural. Nós, indígenas, estamos em contexto de imigração, e nós deslocamos de nossos territórios em busca de um futuro melhor, por melhores oportunidades de emprego e qualidade de vida, além também de refúgio político e social. Sendo assim, estamos principalmente nas capitais, zonas metropolitanas e fronteiras. Devido à precarização de mão de obra imigrante, muitas vezes trabalhamos em empregos terceirizados e de baixa remuneração, trabalhos análogos à escravidão”, destacou Tania, que integra o coletivo de indígenas imigrantes Cholitas da Babilônia, em São Paulo.
Em sua manifestação Tania Sahire apontou ainda que não existem dados exatos sobre povos indígenas imigrantes que vivem no Brasil. “A constante falta de dados sobre nossos povos resulta no apagamento da nossa identidade perante o Estado. No entanto, encontramos maior acolhimento e reconhecimento como indígenas pelos parentes brasileiros do que pelo próprio Estado”, observou.
Demarcação de terras é a principal bandeira de luta da mobilização – Foto: Camila AraujoDurante a Marcha, o coordenador Executivo da Apib pela a Coiab, Kleber Karipuna, reforçou a luta dos povos indígenas por demarcação e proteção aos territórios.
“É uma marcha de luta, de resistência, de reivindicar ao governo brasileiro, ao Estado brasileiro, aos três poderes, que avancem com os nossos direitos de demarcação das terras indígenas, que está totalmente paralisado. Então, estamos aqui, firmes e fortes nessa primeira marcha, numa expectativa muito boa de participação e a nossa segunda marcha na quinta-feira com certeza esse número vai ser muito maior”, destacou.
A segunda marcha “Nosso Marco é Ancestral. Sempre Estivemos Aqui” acontece na quinta-feira (25), a partir das 15 horas. A expectativa da APIB é de que mais de 8 mil indígenas participem da mobilização.
A 20ª edição do Acampamento Terra Livre iniciou nesta segunda-feira (22) e a programação segue até sexta-feira (26). Na tarde desta terça-feira (23), os indígenas participam de uma plenária, às 14h, sobre “Os desafios enfrentados pelos povos indígenas frente à aprovação da Lei do Marco Temporal”. Às 16h acontece a plenária “Mulheres Biomas na construção de agendas rumo a COP 30”. As atividades do dia finalizam com apresentações e manifestações culturais.
Programação do ATL segue até sexta-feira (26) – Foto: Rafa Stedile
Na quarta-feira (24) os indígenas discutem temas sobre “Políticas pelo Bem viver indígena”, entre estes educação escolar indígena, saúde e saúde mental. A programação completa está disponível no site da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
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