Ipê: poesia, silêncio, cor - olhos & palavras de Áurea Cunha

Enquanto outras árvores perdem as folhas e se recolhem, os ipês se exibem, como se o frio lhes trouxesse força, num claro desafio a lógica da estação.

Ipês não tem pressa, aguardam até a última flor se desprender lentamente da árvore, enquanto desenham tapetes generosos sobre o chão, para que os caminhantes continuem desfrutando e lembrando da beleza que nasce daquilo que cai.

O nome “ipê” vem da língua tupi e significa “árvore cascuda” — guarda em sua pele o segredo da sobrevivência. E é justamente essa casca que carrega propriedades medicinais, usadas há muito em chás e remédios naturais.

Curiosamente está na maioria das indicações fito energéticas do meu médico; clínico geral, nada convencional, por sinal. Como se o ipê, além de florir no frio, também soubesse curar os invernos que carregamos por dentro.

Ele floresce quando tudo parece estéril, quando a paisagem se apaga, quando o mundo pede recolhimento. E nesse momento de pausa, ele nos fala — sem dizer nada — sobre renovação, resiliência e sobre a beleza que há em continuar caminhando.

No chão, o tapete de flores cobre a terra como se a própria natureza estendesse um manto de esperança. E então o ipê nos instiga a lembrar que há beleza na resistência, poesia no silêncio e força em florir quando ninguém espera.

Talvez o ipê nos ensine que os invernos da vida não são apenas tempos de espera, mas convites para transformar aquilo que já não faz sentido, que já não ressoa com alguém que está na ante sala da primavera. Se até uma árvore cascuda pode florir no frio, nós também podemos encontrar nossos próprios jeitos de florescer — mesmo que que seja aos poucos, mesmo que precisemos perder todas as folhas, mesmo que ninguém veja.