Ádana: “Quero ser médica para meu povo” – Fotos: Victor Hugo Tadioto
Com jaleco e estetoscópio, Ádana contou, na abertura da I Semana dos Povos Indígenas da Unioeste, Campus de Cascavel, um pouco de sua história, nos entremeios de dureza, um tanto rispidez e muita garra, como ainda é para os milhares de indígenas do País, “Eu nasci e sempre morei na aldeia. Estudar para mim foi um meio de libertação. Quando vi meu nome na lista de aprovados, queria explodir de felicidade. Agora vou me dedicar para conseguir terminar o curso e atuar dentro da minha aldeia, atendendo minha gente. Meu povo. Ser médica lá onde elas estão e vivem suas dificuldades” diz ela, que mantém o sotaque da língua nativa, o kaingang.
Originária da Terra Rio das Cobras, em Nova Laranjeiras, a aluna já milita em favor da causa entre a comunidade acadêmica, integra o Diretório Central dos Estudantes (DCE). “Ainda sofremos preconceito. Ao mesmo tempo que vejo um olhar acolhedor e de carinho, percebo estranhamento e até mesmo preconceito. Mudar isso é uma meta de vida. Acredito que isso é missão”. Nas Terras Rio das Cobras moram aproximadamente 3 mil indígenas.
Depois de formada, Ádana pretende não só atuar na aldeia, mas também viajar e dialogar com outros povos. “Eu nunca tinha morado fora da aldeia. Eu sinto falta da família e principalmente da união das famílias, das conversas. Sinto saudades da comida. Agora é focar e estudar”.
Ádana e a mãe Doracilda, compromissos com a identidade mantidos
Durante a semana cultural, ela trouxe do Rio das Cobras sua mãe Doracilda Korigesânh, de 58 anos, que sobrevive da venda de artesanato e de uma aposentadoria como professora do ensino fundamental. Sobre a conquista da filha, a mãe não esconde orgulho, palavra que não tem tradução na língua kaingang. “Não tenho como dizer. Esse curso. Essa conquista. Eu estudei Pedagogia e acredito que isso inspirou minha filha” diz a mãe.
Mãe e filha se comunicam na língua nativa e mostram sintonia e o afeto materno, que ultrapassa as fronteiras de terras e de língua, no tempo e espaço. “Eu trago em mim o conhecimento dos meus ancestrais e a força que me passaram. Na aldeia que moro, temos muitas dificuldades, a saúde é uma delas. Temos uma UBS [Unidade Básica de Saúde], o que é pouco”.
Ádana está entre os 35 indígenas que atualmente cursam a Unioeste
Atualmente a Unioeste conta com 35 alunos indígenas, matriculados nos Campi de Cascavel, Francisco Beltrão, Foz do Iguaçu e Marechal Cândido Rondon. Até o ano de 2023, formaram-se na Universidade Estadual do Oeste 12 indígenas.
Os acadêmicos indígenas matriculados e com frequência regular, recebem atualmente auxílio permanência mensal no valor de R$ 1.125,00 custeado pelo Governo do Estado.
A Unioeste há anos investe numa política de inserção da comunidade indígena nos seus cinco campi, que incentiva permanência e a formação desses acadêmicos na Instituição para que possam levar os seus conhecimentos até suas comunidades.
A partir da nova legislação, sobre a reserva de vagas suplementares para indígenas nas Universidades Estaduais Paranaenses, a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – SETI delegou competência às Universidades para que organizem o Vestibular dos Povos Indígenas no Paraná.
O Censo 2022 sobre os povos indígenas, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com o apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), aponta que a população indígena do país chegou a 1.693.535 pessoas, o que representa 0,83% do total de habitantes. Conforme o IBGE, pouco mais da metade (51,2%) da população indígena está concentrada na Amazônia Legal.
Em 2010, quando foi realizado o Censo anterior, foram contados 896.917 indígenas no país. Isso equivale a um aumento de 88,82% em 12 anos, período em que esse contingente quase dobrou. O crescimento do total da população nesse mesmo período foi de 6,5%.
A Semana dos Povos Indígenas é celebrada no Brasil, com foco no dia 19 de abril e tem como propósito celebrar a diversidade das histórias e das culturas dos povos indígenas brasileiros; combater preconceitos contra os indígenas e estabelecer políticas públicas que garantam os direitos dos povos originários.
A data foi criada, em 1943, durante a ditadura do Estado Novo. Seu surgimento se deu, em boa medida, pela pressão de Marechal Rondon, importante indigenista brasileiro.
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