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Maria Firmino dos Reis, primeira mulher a publicar um romance no Brasil
A Flip anunciou a programação principal de sua 20ª edição, que será realizada entre os dias 23 e 27 de novembro na cidade de Paraty – RJ. Com o desafio de trazer para o centro da cena escritores e artistas colocados à margem, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) chega à 20ª edição com o tema Ver o Invisível e homenagem à escritora Maria Firmina dos Reis. O evento também traz na programação a homenagem à fotógrafa Claudia Andujar.
Um dos maiores destaques foi a homenagem à escritora Maria Firmina dos Reis. Em um ano marcado pelo bicentenário da Independência e pelo centenário da Semana de Arte Moderna, essa escolha valoriza quem trabalha incessantemente pela palavra e por um ambiente cultural e educacional mais acolhedor, seja nos centros econômicos ou nas bordas do país.
Anúncio do livro de Maria Firmina à época do lançamento (Reprodução Internet)
As personagens e narrativas memoráveis de Maria Firmina têm inspirado coletivos de leitura, professoras e autoras contemporâneas com sua linguagem, imagens e abordagens de um Brasil real e ficcional que atravessa duzentos anos de uma independência controversa.
A homenagem a Maria Firmina dos Reis reafirma o propósito da Flip de se conectar com pessoas das mais variadas origens e trajetórias para fazer o Brasil conhecer mais de si mesmo. E reforça o desejo de que a pluralidade de discursos possa ser ouvida em Paraty e levada para longe por cada pessoa que participar da festa. À autora serão dedicadas duas mesas na programação principal da Flip e, em outubro, um ciclo de debates em parceria com o CPF/Sesc.
Embora não haja certeza sobre a data, o mais provável é que Maria Firmina dos Reis tenha nascido em 1822. Escritora e educadora, em 1859 lançou Úrsula, romance que inaugura, no Brasil, com genialidade, a linhagem da literatura abolicionista e que, após anos de apagamento, vem paulatinamente ganhando mais atenção, dentro e fora do Brasil. O ineditismo e a valentia do texto de Maria Firmina dos Reis são significativos para entender como ela ao mesmo tempo leu o seu momento histórico e soube fabular a partir dele. Professora de primeiras letras em Guimarães, no Maranhão, sua obra prolífica se construiu praticamente em paralelo à literatura majoritariamente masculina e branca dos círculos literários brasileiros. A homenagem a ela vem em bom momento, tanto pela qualidade de sua produção em diversos gêneros, como pelo fato de que por bastante tempo ela ficou à margem da história canônica da literatura brasileira.
A escritora negra Maria Firmino dos Reis, autora do romance abolicionista “Úrsula”, é homenageada pelo Flip 2022 – (Reprodução / Flup / João G. S. Araújo)
A obra e a vida de Maria Firmina são também o símbolo de um Brasil que luta para sair das malhas de sua história de raiz colonial, marcada pela violência física e também simbólica, geradora de uma separação brutal entre aqueles que têm e os que não têm acesso ao mundo da imaginação propiciado pela letra impressa.
Autora do primeiro romance abolicionista do país, Úrsula, lançado em 1859. Escritora e educadora, sofreu com o “apagamento” histórico e vem sendo redescoberta no Brasil e no exterior. Publicou contos e poemas em jornais, compôs o Hino da Libertação dos Escravos e fundou uma escola gratuita para crianças.
Nesse sentido, sua atuação vigorosa como educadora nos dá um recado sobre a vitalidade e a importância da cultura num país tão machucado quanto o Brasil. Somente na década de 1970 Maria Firmina emerge como voz dissonante, resultado de leituras contra-hegemônicas de pesquisadores e pesquisadoras. Que Maria Firmina dos Reis tenha morrido sem qualquer prestígio, em 1917, torna ainda mais urgente comemorar seu legado.
Mais homenagem
Claudia Andujar e o xamã indígena Davi Kopenawa, em mesa que a Flip dedicou à Amazônia em edição passada (Fernando Frazão/Ag. Brasil)
Como artista homenageada, a Flip deste ano joga luz também sobre outra mulher. A obra de Claudia Andujar, fotógrafa nascida na Suíça em 1931, que se estabeleceu no Brasil em 1955, depois de passar por alguns países fugindo da perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Por décadas, percorreu o país trabalhando para revistas como Life, Aperture, Look, Cláudia, Quatro Rodas e Setenta e, como freelancer, para a revista Realidade.
A partir da década de 1970, Claudia participou de exposições no Brasil e no exterior, com destaque para a 27ª Bienal de São Paulo e para a exposição Yanomami, na Fundação Cartier de Arte Contemporânea, em Paris, no ano de 2002.
De acordo com o curadoria da Flip, a sensibilidade no olhar da fotógrafa dialoga com o tema dos invisíveis proposto pela Flip.
“O trabalho da Claudia Andujar é um tributo à sensibilidade diante daqueles que estão à margem. A própria produção fotográfica dela tem muito a ver com a literatura, a fotografia é muito narrativa, é sobre essa aproximação, a construção de uma relação com o outro e, ao mesmo tempo, é uma produção que nunca apaga esse outro. A fotografia da Claudia é o próprio exercício de ensina a ver o invisível”, afirmou.
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