Na foto, cientistas que atuam no Instituto reunidas em frente ao prédio da Biblioteca do Instituto. (Foto: Butantan Notícias)
Em 2020, o Instituto Butantan (IB), um dos maiores centros de pesquisa e produção de imunobiológicos do país fez um mapeamento inédito sobre a presença feminina na área da pesquisa na instituição. De acordo com dados de contratação da Divisão de Recursos Humanos, o Butantan tem 71% de seu corpo científico formado por mulheres. Do total de pesquisadores contratados, seja via Fundação ou Instituto, apenas 29% são homens.
A explicação para a predominância feminina se encontra em diversos fatores, dentre eles o acesso crescente de mulheres à educação superior nas últimas décadas e também devido às áreas de estudos que predominam no IB, em sua maioria das ciências biológicas e da saúde, que costumam tradicionalmente atrair maior contingente feminino.
“Se olharmos as fotos antigas dos laboratórios do Butantan, veremos uma maioria de homens e poucas mulheres. Acredito que essa chave tenha virado com o próprio acesso às universidades porque, antigamente, para alguém fazer um curso superior era preciso se deslocar para as cidades grandes ou até mesmo para fora do país e era muito raro mulheres conseguirem fazer isso, ou inclusive serem aceitas socialmente nesses espaços”, disse Ana Marisa Chudzinski, diretora do Centro de Desenvolvimento e Inovação do Instituto em entrevista a boletim interno daquela instituição.
Ao analisar o cenário nas agências de fomento, percebe-se que o número de bolsas concedidas às mulheres também tem sido maior. Em 2019, 60% do total de bolsistas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) eram mulheres, e, de acordo com os últimos dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em 2015 o número de bolsas concedidas para pesquisadoras na área de ciências biológicas correspondeu a 61% e na área da saúde a 68,3%.
Sobre o perfil das pesquisadoras do IB, destaca-se o alto número de profissionais em nível 6, que é o nível mais alto da carreira científica. Das 99 especialistas, 43 estão neste nível. “Elas são pessoas extremamente estratégicas para estudos que demandam um conhecimento multidisciplinar em projetos com diferentes linhas de frente. Elas conseguem harmonizar, construir e discutir os temas com competência. Acho que essa é uma característica muito forte das pesquisadoras do Butantan”, ressalta Sampaio.
Também é notória a presença de alunas na força de trabalho dos laboratórios. Do total de 417 estudantes, 64% são mulheres e 36% são homens.
Para Sandra Sampaio, diretora do Centro de Desenvolvimento Científico, é importante analisar feitos alcançados. “Não avançamos apenas em números, também passamos a ter um papel na ciência. Nós, de fato, trazemos contribuições e estamos em um período de ascensão do Butantan que coincide e se assimila ao crescimento não só do número, mas também das atividades, atitudes e realizações das pesquisadoras do Instituto”.
Embora os números indiquem uma presença feminina maior na ciência da instituição e até mesmo nas pesquisas apoiadas pelas agências de fomento, ainda há um caminho a ser percorrido em relação ao que se imagina de um cientista. “Já passei pela situação, em congressos e em outros encontros, de descobrir que se referiram a mim como ‘o pesquisador Sampaio’, antes de me conhecerem pessoalmente. A primeira ideia até hoje é de que o nome assinado no artigo nunca é de uma mulher. No imaginário continua a imagem de um homem”, ressalta Sandra.
Para Ana Marisa, a visão caricata que se tinha do cientista – um homem mais velho e fissurado pela ciência – começa a mudar a partir da criação da carreira científica. “Como hoje a carreira é regulamentada, vemos que cientistas são pessoas normais que nascem, crescem, se casam, têm filhos, têm goteira em casa, também pegam trânsito e precisam resolver problemas.”
No caso das mulheres na ciência, as questões relacionadas à vida pessoal e à carreira se convergem em algum momento, especialmente no caso da maternidade. Dados obtidos pelo projeto Parent in Science, com 885 pesquisadoras, mostram que essas mulheres passaram por uma queda no número de publicações (indicador de produtividade) após o nascimento de um filho, não em razão das suas novas demandas pessoais, mas, sim, devido às exigências de desempenho e progressão profissional.
“O que conseguimos construir é ainda maior quando consideramos que, apesar dos papéis concebidos socialmente, seja a maternidade, seja como cuidadora de um familiar, nosso papel científico passou a ser reconhecido e nós sempre estivemos na ciência. Andamos com a pesquisa e temos importantes líderes em temáticas e estudos”, finaliza Sandra.
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