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Marcha do movimento “Acampamento Terra Livre” em Brasília – Foto: Ƙaiti Topramre / @kaititopramrefoto / Cobertura Colaborativa APIB
Uma pesquisa recente revela visões distintas da população brasileira sobre os povos indígenas. O estudo “Narrativas ancestrais, presente do futuro” mostra percepções sobre os povos originários do Brasil entre pessoas engajadas e não engajadas com a causa.
O projeto teve 350 entrevistas em profundidade com diferentes segmentos da sociedade, além de uma análise de 9,7 milhões de posts nas redes sociais. As entrevistas com o grupo considerado não engajado com a causa revelam desconhecimento da importância e da realidade dos indígenas. E revela sentimentos que vão de antagonismo a desinteresse e rejeição aos direitos desses povos. .
A pesquisa aponta que esse público, em geral, reconhece a conexão dos povos indígenas com o meio ambiente. Mas não compreende a importância de estudos, inclusive internacionais, que relacionem os direitos territoriais dos indígenas com a agenda climática. Os chamados não-engajados acabam, ainda, associando os modos de vida dos povos originários com a pobreza, necessidade de auxílios governamentais e carências em geral.
Já entre o público engajado a visão é outra. A pesquisa mostra que essas pessoas reconhecem a auto-representação, o protagonismo e o processo de ocupação dos espaços com vozes dos próprios indígenas como algumas das grandes novidades dos últimos 10 anos.
Sônia Guajajara, Ailton Krenak, Joênia Wapichana, Cacique Raoni e Davi Kopenawa foram apontados como representantes indígenas de maior destaque do período. Entre as principais organizações destacadas pelos engajados na causa, está a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Por outro lado, os não-engajados atribuíram a representatividade indígena a lideranças religiosas e organizações, como a Fundação Nacional do Índio (Funai).
O Acampamento Terra Livre, que chegou à 18ª edição este ano, foi apontado como o principal evento da última década pelo público engajado. A coordenadora do estudo, Cristiane Fontes, destaca recomendações que fariam o Brasil avançar no reconhecimento dos modos de vida e dos direitos dos povos indígenas.
“Nós estamos recomendando algumas medidas, como a promoção de atividades socioculturais, dando a oportunidade dos não-engajados de interagir com os povos indígenas. Estamos sugerindo os candidatos não-indígenas de assumir compromissos com essa causa. Além disso, pedimos que os estudos sobre a importância de indígenas ao meio-ambiente tenham mais visibilidade e sejam melhores disseminados”, explicou ela.
A pesquisa aponta que a concepção do público não engajado sobre os povos originários é formada a partir de fragmentos de informação na grande imprensa e posts nas redes sociais, muitas vezes com conteúdo produzido por Bolsonaro e seus aliados. Já para os engajados, apesar de a produção jornalística ainda ser “pouco ou mal contextualizada” ou “distorcida”, cresce e melhorou a cobertura nos últimos anos, principalmente com o assunto colocado no centro do debate político com Jair Bolsonaro na Presidência.
Entre ambos os públicos entrevistados, foi quase consenso que, sob o atual governo, os ataques de grileiros, garimpeiros e fazendeiros e a vulnerabilidade dos povos indígenas aumentaram ainda mais. Para Basílio Priprá, liderança do povo Xokleng, de Santa Catarina, o caminho para reduzir tais vulnerabilidades e violências passa pela educação até por mudanças na política.
“A maior dificuldade que temos é o preconceito sobre as demarcações de terra no Brasil. Para reduzir essa situação é preciso que as escolas falem mais sobre os povos indígenas. Somado a isso, o Congresso Nacional precisa mudar seu ponto de vista, respeitando mais os indígenas e a Constituição Federal.”
A pesquisa “Narrativas ancestrais, presente do futuro” teve participação da Ipsos, empresa de pesquisa, e da diretoria de análises de políticas públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV).
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