M. parou sua bicicleta rosa shocking diante da casa e disse feliz: — Eu passei! Verão. Longas tardes com sete garotas a ensinar-lhes matemática. Naquele tempo existia o que chamavam exame de segunda época. Das sete garotas apenas uma não passou no exame. M. vibrou com a conquista, pois uma doença a tirou das aulas. Além dos cinco cruzeiros novos pelas aulas, presenteou-me com um tecido colorido que minha mãe transformou em um vestido tubinho. Quarenta anos depois alguém gritou meu nome com o mesmo tom feliz daquela tarde dos nossos treze anos. M. reconheceu meu rosto, agora envelhecido, em uma rua qualquer daquela cidade. Lembrei aquelas aulas e meu primeiro e único “trabalho” infantil. A mãe decidiu que eu deveria cobrar e entendo a mãe, foi pelo nosso real estado de pobreza à época. Enfim, minha infância livre, plena de brincadeiras, não se compara ao martírio diário de pequeninos escravizados pelo mundo. Milhões de crianças em trabalhos de risco – isto empobrece nossa humanidade.
___________________________Bárbara Lia publicou o conto originalmente na coluna Luzes da Cidade, do jornal Brasil de Fato.
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