Era só mais um dos tantos cafés no lugar mais gostoso da cidade, a pastelaria das “ vizinhas”. Lá, todos são vizinhas e vizinhos para as atendentes. Um detalhe bem peculiar.
Ia eu dar minha primeira mordida na costumeira coxinha de mandioca com molho picante, quando apareceu um menino magro, de no máximo 14 anos pedindo algo para comer. Não falou nada, só colocou um papel na nossa mesa onde dizia que tinha fome. Vinha desde a entrada distribuindo cópias de seu apelo.
Achei invasivo. Poxa, pensei, não se pode tomar um café em paz?
Um outro vizinho, da mesa ao lado, também reclamou, ele em voz alta. “Veja, são uns mal-educados, jogam as coisas na mesa da gente e nem dizem um bom dia”.
Meu amigo, que me acompanhava para o café, disse para o menino pedir o que quisesse, mas ele só pediu um pastel. Antes, no entanto, sugeriu ao garoto que quando quisesse algo, não tivesse timidez. Seria mais fácil se cumprimentasse as pessoas com um bom dia.
O menino foi até o balcão, pediu a uma das vizinhas atendentes o que queria. Esperou pelo pastel, pegou seu lanche e em vez de ir embora, voltou a nossa mesa. Estendeu a mão para meu acompanhante e agradeceu, demonstrando que estava fazendo diferente da primeira abordagem. O menino se agigantou e minha cara caiu, a do vizinho não sei. Caraca! Nunca tinha visto uma transformação tão rápida. Presenciei aquilo que chamam de salto quântico. Só que a gente leva duzentos anos para dar o tal salto, quando dá!
Diante da minha surpresa, meu amigo de café disse: ”É que todo mundo tem um sol dentro de si”.
Me recolhi a minha insignificância. Tinha visto dois sóis. Muita luz para quem acabou de acordar.
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