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Os dias parecem tão curtos … e viveram felizes para…
. felizes para quando? felizes para quem? numa aparente, inquestionável, relativa atmosfera de conquistas são tantas oportunidades quem nem posso reclamar da vida e nem sobra tempo para celebrá-la até pra ler Fanon meu pensamento continua tão colonizado que esqueço gostos ignoro e maltrato meu próprio corpo forço-o cotidianaMente e possivelmente não terei aposentadoria
. os dias parecem tão curtos nem poesia mais eu faço nem poesia mais eu tenho e quando desperta o celular às 5 da manhã eu, desde ontem já estava atrasada porque não li os ditos clássicos nem os pós-coloniais não aprendi francês e meu inglês é medíocre
. os dias parecem tão curtos ontem eu nem consegui dar boa noite pras crianças e minha estrela Dalva, avó não está mais entre nós para me dar aquele abraço que desmembrava o tempo para me lembrar do quanto é importante caminhar sem pressa vô Aguinelo me fazia rir, vô Gilberto contava histórias, e vó Ilda, costureira, criava tantas lindezas com aqueles retalhos!
. os dias parecem tão curtos já faz meses que não toco Berimbau Me resta criar hipóteses sobre qual o efeito de poder produzido em mim quando, após o vigoroso toque da baqueta de madeira no metal, a caixa de ressonância vibra, graças à tensão da verga, ocasionando o som.
. os dias parecem tão curtos alguém pode, por favor, me explicar o que significa esse tal de estruturalismo? os dias parecem tão curtos e quando o nível de estrogênio cai, tudo dói! os dias parecem tão curtos
. and I feel so tired
Reproduzido de Revista Firminas –
Mariana Machado Rocha (Mariana do Berimbau) É Pedagoga; mestra e doutoranda em Educação pela Universidade de São Paulo; Poeta; compositora e performe. Mariana pratica manifestações artístico-culturais afro-brasileiras como dança e capoeira desde 2012. Publicou o livro de poesias Meu Sobrenome é Ousadia, em 2016. Atuou como professora convidada do curso de Administração Pública da FGV-EAESP em 2019, ano em que ministrou a disciplina “Gênero e Raça: pensando com o feminismo negro e a cultura afro-brasileira”.
Contato: machado.mari.r@gmail.com
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