Na linha de frente no combate ao novo coronavírus, em Foz do Iguaçu, um grupo de estudantes e docentes da UNILA ganhou uma dose de esperança, após dez meses de atuação direta com pacientes infectados pelo Sars-Cov-2. A partir da última quarta-feira (20), eles receberam a primeira dose da Coronavac. Juntamente com eles, outros profissionais da área de saúde do Município também foram vacinados, de acordo com o Plano Municipal de Imunizações. Além dos profissionais de saúde, idosos de instituições de longa permanência também estão na lista dos que receberam as primeiras das 3.193 doses do imunizante.
“Estando na linha de frente, estamos mais expostos ao adoecimento. A maioria de nós, por sorte, não é de grupo de risco para adoecimento grave – embora alguns sejam e, além disso, existem casos graves inesperados entre pessoas aparentemente sem risco. Nossa vacinação tem a dupla finalidade: nos protege de infecção e também preserva a nossa força de trabalho, pois em caso de adoecimento, teríamos que ficar dez dias afastados, no mínimo, o que nesta época de intensa necessidade de profissionais de saúde é proibitivo”, afirma a infectologista, Flavia Trench, que recebeu a vacina por sua atuação como médica do Siate.
Docente do curso de Medicina da UNILA, Trench contextualiza que esta vacina é feita com vírus morto, uma das técnicas mais antigas e conhecidas para fazer vacinas contra doenças virais. Ela ressalta a segurança desses imunizantes. “A vacinação nos dá mais serenidade para seguir na luta contra a Covid-19 na nossa cidade. Além disso, devemos ser um exemplo para a população acreditar na segurança das vacinas como forma de prevenção de doenças, sejam elas vacinas do sistema público ou do sistema privado. Vacinas oferecem prevenção de alta qualidade e segurança, preservando vidas e evitando o sofrimento do adoecimento, além do impacto sobre a economia causado por um trabalhador ausente de sua função”, salienta.
Embora ainda haja desconfiança sobre as vacinas, ela explica que, no caso da Coronavac, uma eficácia de 50% significa que de cada 100 pessoas vacinadas, 50 ficam garantidas de que o vírus não será capaz de adentrar seu organismo. “Mesmo que o vírus consiga entrar no organismo, 78% dos vacinados não vão apresentar sinal evidente de doença e 100% dos vacinados, mesmo que venham a apresentar sintomas e doença evidentes, a doença não será grave e nem levará à morte”, esclarece. Trench explica que a vacina contra a Covid-19 só dará uma proteção mais integral cerca de 15 dias após a segunda dose. Ela destaca, ainda, que é preciso reforçar que, mesmo após as duas doses, deve-se manter o uso de máscara, a higienização das mãos e o distanciamento social.
Para o médico e também professor de Medicina da UNILA, Roberto de Almeida, a vacina é um meio científico de lidar com uma dificuldade e aponta para o problema de manipulação das informações, que podem ganhar mais publicidade do que pesquisas e publicações com embasamento científico. “Muita gente tem levantado dúvidas em relação ao tempo em que foi desenvolvida [a vacina], mas, se formos pensar, ano passado, todo mundo parou pra fazer só pesquisas nessa área, então foi muito intensa a resposta científica, a prioridade, o envolvimento de toda comunidade científica nessas questões”, pontua Almeida, que está na linha de frente no combate à Covid-19, como coordenador da UTI do Hospital Municipal.
Gabriel Moura, estudante de Medicina da UNILA, que também atua diretamente no enfrentamento à Covid-19 e foi vacinado, reforça o coro sobre a confiança na ciência e na segurança da vacina, cujo estudo, como salienta, contou com a participação de mais de 13 mil profissionais da saúde. O discente conta que o ano de 2020 foi de muita entrega dele e de todos os colegas e equipes do Hospital Municipal. “Acho que foi uma injeção de ânimo, acima de tudo, pois todos nós estávamos esgotados em não ver nenhuma possibilidade de sair dessa rotina desgastante, dessa rotina de ver pessoas se internando todos os dias, de ver pessoas vindo a óbito, infelizmente, toda semana e, às vezes, todo dia, mais de um por dia”, relata.
Doses de emoção e esperança foram alguns dos sentimentos relatados nessa primeira etapa de imunização, diante de um cenário, em Foz do Iguaçu, no qual mais de 20 mil pessoas já foram infectadas pela Covid-19. “Receber essa vacina neste primeiro momento me deixou muito emocionada e agradecida. Representa o início do fim de um período turbulento que nos trouxe muita tristeza. Hoje (anteontem) celebro a ciência, as parcerias em prol da população, a gestão de qualidade e o empenho de todos os envolvidos nessa batalha”, declara Maria Leandra Terencio, docente da UNILA e coordenadora da equipe do Laboratório de Biologia Molecular que, desde março de 2020, já realizou mais de 50 mil exames RT-PCR, para detectar a Covid-19.
Esperança também foi a palavra usada pela médica formada pela UNILA Verónica Benitez e pela estudante de Medicina Rebeca Franco, ambas também vacinadas. “O coronavírus fez eu viver experiências que não imaginava passar tão cedo na minha profissão, foram e são dias ainda de agonia e medo, diante da gravidade dos pacientes”, conta Verónica.
Rebeca revela que um dos principais aprendizados que ela leva dessa experiência na pandemia é a esperança, empatia e trabalho em equipe. “Acho que tem situações na vida que, como pessoas, temos que dar o nosso melhor, já que isso pode dar uma pequena luz na vida de outras pessoas”, afirma. A estudante também destaca o empenho de seus colegas de trabalho, estudantes da UNILA. “Aprendi muita coisa nesse processo e acredito que as coisas vão melhorar muito mais quando a vacinação chegar a todos”, complementa.
Próximo de completar quase um ano de trabalho na pandemia, a vacina trouxe, também, o sentimento de maior segurança para os que estão na linha de frente, lidando com a vulnerabilidade de serem infetados. “Agora nos sentimos mais seguros e, também, mais tranquilos. Durante esse tempo, tivemos muitos membros da equipe afastados por conta da Covid. E isso, muitas vezes, acabava aumentando significativamente a carga de trabalho”, relata Maria Leandra.
Entre os que integram essa equipe do Laboratório do Hospital Municipal e que contraiu a Covid-19, está Welisson Costa, estudante de Medicina. Ele conta que foi infectado duas vezes. “Me sinto privilegiado e mais seguro ao tomar a vacina, pois, durante todos esses meses, eu senti medo de pegar Covid e levar para casa, haja visto que possuo grupos de risco em minha família”, conta.
O mesmo sentimento de segurança foi destacado pela estudante de Biotecnologia, Rafaela Favato, que também atua no laboratório e contraiu a doença. “Me sinto aliviada por estarmos dando início ao fim desta pandemia. Apesar de sermos um grupo exposto todo os dias ao vírus, ainda fica o sentimento de querer que todos fossem prioridade a tomar a vacina. Porém, por logística, isso seria impossível, então seguimos na esperança de que, em breve, grande parte da população já estará protegida”, coloca.
O estudante de Medicina Gabriel Moura passou pela UPS respiratório, central telefônica, enfermaria Covid, e agora, com mais seis colegas, irá trabalhar na triagem da Covid-19. O futuro médico destaca a importância das instituições públicas, do SUS e das universidades públicas nesse momento de pandemia. “Se não fossem as universidades públicas, as instituições públicas, a dedicação de milhares de pessoas que trabalham em pesquisa, em institutos federais, em vigilância epidemiológica e, também, na atenção direta às pessoas doentes, nós estaríamos numa situação muito pior”, salienta.
A voz em defesa do SUS e das instituições de pesquisa também vem da estudante de Biotecnologia Rafaela Favato. “A UNILA e as demais universidades públicas têm dado sangue e suor no combate à Covid-19 desde o princípio. Esse espírito de tentar ajudar a população a qualquer custo nasce dentro das universidades públicas, e te incorpora – mesmo que não seja algo intrínseco seu. Muitos alunos, professores e técnicos estiveram, desde o começo, se doando em busca de soluções para o caos da pandemia”, aponta.
Em um contexto em que muitos médicos estão sendo formados na UNILA, durante a esse momento de crise sanitária, Gabriel Moura lembra , a pandemia “criou uma geração de médicos na UNILA que saiu com uma visão muito aguçada de saúde pública, principalmente, da importância da saúde pública pra construção de um país melhor, de um mundo melhor, de uma América Latina mais igualitária. A gente pôde ver, também, o quanto a cidade (Foz do Iguaçu) depende muito de seus vizinhos e de como a saúde, ou é pra todo mundo, ou não é pra ninguém. Todo mundo tem que estar seguro, estar protegido. E assim vai ser com a vacina também. A gente tem que lutar pra que a vacina chegue pra todo mundo, ou para o máximo de pessoas possível”, destaca Gabriel.
A esperança é de que a vacina também possa chegar, de forma universal, a toda a população da Tríplice Fronteira. “Como paraguaia, sem dúvida, gostaria muito que a vacina chegasse o mais rápido possível no Paraguai, tendo em conta que isso vai melhorar bastante a situação que está vivenciando meu país hoje em dia, principalmente a região da fronteira. Como todos sabem, muitas pessoas ficaram sem trabalho, cada dia isso está aumentando – e muitas famílias estão passando necessidade. A acho que, com a vacina, isso vai cambiar bastante o panorama e vai dar esperança na população, como um novo começo”, acredita Rebeca Franco.
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