– Um Conto de Matheus Mendes –
– Você não ouve absolutamente nada? – perguntou-me, estendendo diante de meus (não-) ouvidos o ponto de interrogação para a mais óbvia oração de resposta. – Não. Nada a não ser o som da sua voz – respondi, com afeto pulsante a cada sonora sílaba. Os olhos cor-de-pérola imediatamente se inundaram. Não houve, porém, cachoeira. Ela era, ainda, como uma muralha de força que não podia evitar, mesmo que fosse seu paradoxal desejo, dados os frequentes momentos de cegueira à alegria. Continuou a me observar na negritude, as pupilas focadas na escuridão, enquanto eu, imóvel, deslocava-me por dentro de seus pensamentos. Conhecia-os. Todos. Era detentor de todas suas surdas paixões e mudas esperanças. Calaram-na antes mesmo do primeiro choro. Seu primeiro respirar foi sufocado pela destruição de seu destino, quase como se assassine o próprio acaso. Fizeram-na dançar no vórtice de seu próprio silêncio por muito tempo, até que o infinito de sua calidez se transformou em irreversível não-ser. Era poeta, pois não conhecia as palavras.
Matheus Mendes é estudante de Medicina, na Unila, em Foz do Iguaçu, Pr. Conto publicado na revista Escrita 41.
Assine as notícias da Guatá e receba atualizações diárias.